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Por Tricia Oliveira e Igor Tavares
Foi alvo de intensa repercussão um recente precedente oriundo do Tribunal Superior do Trabalho, proferido nos autos de uma ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho, no qual uma empresa do ramo da construção civil foi condenada ao pagamento de R$ 200 mil a título de indenização por danos morais coletivos, diante da contratação de uma empresa de prestação de serviços que não cumpria com os critérios impostos pelos artigos 4º-A e 4º-B da Lei 6.019/1974, que tratam dos requisitos necessários para a terceirização ser considerada lícita, em especial a necessidade de possuir capital social compatível com seu número de empregados.
Como pontuado pelo ministro relator Augusto César Leite de Carvalho, o descumprimento do referido conjunto de regras é grave, pois seu objetivo não é apenas garantir a solvência das obrigações trabalhistas, mas — principalmente — a segurança dos trabalhadores no ambiente laboral, de modo que todos tenham acesso efetivo às ações, instruções e equipamentos destinados à prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho. Por essa razão, e diante do caráter coletivo da violação constatada no caso concreto, o Tribunal entendeu ser cabível a indenização por danos morais coletivos pleiteada pelo Ministério Público do Trabalho, reformando as decisões das instâncias inferiores que haviam julgado improcedente o pedido.
Decisões estabelecendo condenações similares já foram proferidas pela Justiça do Trabalho no passado, em demandas que questionavam a licitude da terceirização das chamadas atividades-fim das empresas, porém com base em fundamentos diversos. Contudo, com a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), o julgamento da ADPF 324 pelo Supremo Tribunal Federal e a inquestionável legalidade da terceirização de qualquer atividade empresarial, essas ações naturalmente foram desparecendo do Judiciário.
Dessa forma, o precedente aqui discutido é relevante por conta do ressurgimento do tema sob um novo enfoque, algo que deve servir de alerta para as empresas. O entendimento dos ministros no caso foi de que a contratação de prestadores de serviços sem idoneidade financeira para garantir a continuidade de suas atividades empresariais caracteriza o chamado dumping social, fenômeno no qual a empresa, de forma consciente e reiterada, viola a legislação do trabalho para obter vantagens comerciais e financeiras sobre os concorrentes, em razão do baixo custo dessa prestação de serviços.
É importante ressaltar que esse entendimento se encontra em conformidade com o racional adotado em casos similares pelo Tribunal Superior do Trabalho, merecendo especial destaque o julgamento do Incidente de Recurso de Revista Repetitivo (IRR) 190-53.2015.5.03.0090, que fixou tese que alarga o escopo da OJ 191 de sua Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), permitindo que o dono da obra seja responsabilizado pelo inadimplemento do empreiteiro, mesmo que não se trate de construtora ou incorporadora, quando verificado que ele não possuía idoneidade econômico-financeira.
Percebe-se assim que se trata de tese consolidada na Corte Superior Trabalhista, baseada na chamada culpa in eligendo — quando a parte não procede com acerto na escolha do prestador de serviços. De fato, e em especial nas prestações de serviços terceirizados, existem inúmeros casos de empresas que deixaram de existir tão rapidamente quanto surgiram, deixando seus empregados à deriva e sem o recebimento das verbas exigidas pela lei.
Essa questão foi, inclusive, abordada no julgamento do IRR mencionado. O ministro Relator João Oreste Dalazen pontuou que a responsabilização do contratante seria necessária para encontrar uma solução juridicamente apropriada para satisfazer os créditos trabalhistas dos empregados do empreiteiro, evitando que a execução fosse inviabilizada.
Desta forma, e diante dos entendimentos adotados pelo Tribunal Superior do Trabalho sobre o tema, é mais necessário do que nunca que os tomadores de serviços adotem medidas de compliance, auditando e investigando possíveis prestadoras de serviços antes de efetivar a contratação, pois até mesmo a prova de sua idoneidade financeira pode ser necessária no futuro.
Em especial, e diante da existência de regulamentação específica sobre as atividades de terceirização desde 2017, as empresas contratantes devem verificar se a prestadora de serviços atende a todos os requisitos elencados na Lei 6.019/1974, correndo o risco de serem responsabilizadas pelo pagamento não só de eventuais parcelas inadimplidas (consequência natural de sua responsabilidade subsidiária prevista por lei), mas também de indenizações por danos morais coletivos.
Outro ponto de atenção se refere à Instrução Normativa nº 2, de 8 de novembro de 2021, do Ministério do Trabalho e Previdência, que dispõe sobre os procedimentos que devem ser observados pela Auditoria-Fiscal do Trabalho, que prevê em seu artigo 139 que a inexistência de capacidade econômica da prestadora de serviços seria um dos indicadores da caracterização de vínculo empregatício entre os trabalhadores ou sócios das empresas terceirizadas com a contratante.
Sem adentrar a evidente inconstitucionalidade do dispositivo, o fato é que a contratação de empresas sem capacidade econômica compatível com seu número de empregados pode gerar autuações por parte da Fiscalização do Trabalho e o reconhecimento de vínculo de emprego diretamente com o tomador de serviços.
Deve se reforçar, ainda, que as cautelas não devem cessar no momento da contratação, devendo haver previsão contratual acerca da necessidade da prestadora de serviços comprovar mensalmente o pagamento correto dos haveres trabalhistas e dos recolhimentos fiscais e previdenciários, demonstrando que está em regularidade com seus empregados. Nesse sentido, a já mencionada IN nº. 2 prevê em seu artigo 139, §3º que “constitui indicador de incapacidade econômica compatível com a execução do contrato a existência de atraso salarial e de FGTS igual ou superior a três meses por parte da prestadora”.
A despeito dos inegáveis avanços no tema da terceirização nos últimos anos — em especial a superação do entendimento adotado na Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho — a prática demonstra que sua legalização tem um preço, diante do extenso rol de requisitos formais e aspectos burocráticos a serem observados, além dos riscos de condenações para além de verbas porventura inadimplidas pela prestadora de serviços. Isso exige que a escolha do prestador seja extremamente criteriosa e precedida de ampla investigação da operação e de sua capacidade financeira.
Fonte: Conjur
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