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Discricionariedade técnica

Por Flávio José Roman

 

O tema da discricionariedade técnica, embora já contabilize praticamente um século e meio de debates, ainda desperta polêmica entre os cultores do direito administrativo. Com efeito, a disputa entre aqueles autores que veem nos conceitos jurídicos indeterminados uma das possibilidades de exercício de competências discricionárias por parte da Administração Pública e aqueles que negam essa possibilidade reaparece, com ainda maior intensidade, no estudo da chamada discricionariedade técnica. As discussões em torno da discricionariedade técnica, ademais, na contemporaneidade, vinculam-se ao controverso tema da atividade de regulação administrativa.1 Pois bem, durante os anos 1980 e 1990, com a chamada onda neoliberal e o surgimento das agências reguladoras,2 o estudo da discricionariedade técnica ganhou especial atenção da doutrina, interesse acadêmico que persiste até o presente. Não obstante, o tema ainda seja carente de monografias dedicadas exclusivamente ao estudo específico da discricionariedade técnica, a criação das agências reguladoras despertou o interesse para o exercício de competências administrativas que não eram livremente exercidas pela Administração Pública, mas tampouco eram apenas análises de conveniência e oportunidades por parte de gestores administrativos.3 Daí a invocação de uma expressão controversa para indicar que não se tratava de “mera discricionariedade”, com a decisão tomada a partir de juízos pautados exclusivamente por critérios políticos (conveniência e oportunidade), mas também não se cuidava de um ato de competência vinculada e, portanto, completamente sindicável pela autoridade de controle.

Com a finalidade tentar esclarecer o significado desse nebuloso conceito, neste estudo, nossa intenção é mostrar, à partida, a origem e a evolução da expressão discricionariedade técnica (item 1), na sequência buscar uma aproximação com a doutrina nacional produzida sobre o tema da discricionariedade técnica (item 2) e, diante desse panorama, propor uma teoria da discricionariedade, que se notabilize pela forma de exercício dessa prerrogativa e que justifique o emprego de termo tão equívoco (item 3). Ao final, a título de conclusão, proporemos nossa avaliação sobre a forma adequada de controle da discricionariedade técnica (item 4).

 

  • 1. Origem e evolução da discricionariedade técnica

  • 1.1. Origem: conceitos indeterminados e discricionariedade

  • 1.2. Evolução: as divergências sobre a compreensão da discricionariedade técnica

  • 2. A doutrina nacional sobre a discricionariedade técnica

  • 3. Teoria da discricionariedade técnica

  • 4. Controle da discricionariedade técnica

1. Origem e evolução da discricionariedade técnica

 

1.1. Origem: conceitos indeterminados e discricionariedade

 

Um primeiro passo para a compreensão do conceito é tentar esclarecer o surgimento do instituto jurídico em exame. A origem da expressão discricionariedade técnica está intimamente ligada a teoria dos conceitos jurídicos indeterminados. Aliás, neste estudo temos a pretensão de demonstrar que a discricionariedade técnica é um caso especial de aplicação dos conceitos indeterminados.

A temática dos conceitos indeterminados é a história de uma forte e centenária polêmica na doutrina, que reside precisamente na questão atinente à existência de discricionariedade administrativa na definição e aplicação dos conceitos jurídicos indeterminados. A polêmica reside em saber se existe discricionariedade administrativa na definição e aplicação de um conceito indeterminado pela Administração Pública. A polêmica remonta ao debate das posições de Edmund Bernatzik (1854–1919) e Friedrich Tezner (1865–1925), cujas obras, segundo André Cordeiro, “constituem-se as primeiras sistematizações técnico-jurídicas sobre o controle da decisão administrativa que aplica conceitos indeterminados”.4

Segundo o relato de António Francisco de Souza, ainda no século XIX, Bernatzik insurgia-se contra a doutrina então predominante, para assentar que não havia exclusão entre a aplicação da discricionariedade e a aplicação do direito: não eram realidades opostas. Acrescenta André Cordeiro que Bernatzik vislumbrava a Administração como integrante do Estado, razão pela qual também teria competência para dizer o direito. Sempre haveria, segundo a ótica do autor austríaco, atividades que não são totalmente reguladas pelo Direito, razão pela qual somente por meio de conhecimentos técnicos-científicos se poderia concretizar a norma. Afirmou, assim, que as situações previstas em alguns conceitos empregados na lei, como “adequação”, “utilidade”, “perigo” etc., só poderiam ser concretizados depois de um complicado processo em cadeia, que chamou de discricionariedade técnica.5

Afonso Rodrigues Queiró acrescenta que Bernatzik aceitou que nessa esfera, da chamada discricionariedade técnica, os agentes públicos deveriam agir como peritos ou técnicos do interesse público, segundo o que entendiam ser a melhor forma de atendê-lo.6 Quando a norma concede essa discricionariedade técnica, os agentes públicos têm o dever de atuar segundo a convicção que tenham acerca do melhor modo de atingir o interesse público. Assim, a discricionariedade já não era livre como no período absolutista, mas se prestava apenas para dar concreção ao interesse público. Segundo a tese Bernatizk, não só conceitos de valor, mas também empíricos são capazes de gerar discricionariedade, pois também “despertariam uma avaliação subjetiva por parte da autoridade. Isso porque a correção de sua exatidão se circunscreveria a um pequeno círculo de estudiosos especializados, de modo que deveria prevalecer a decisão administrativa”.7 Embora defendesse a ideia de que o controle jurisdicional não poderia ser total, Bernatzik afirmava que “as conclusões dos experts não dependiam de sua vontade, mas eram condicionadas pelas regras da ciência e da arte, sendo certamente impugnável a opinião que manifestamente contrariasse essa regra”.8 Então, caso o administrador não procedesse segundo o dever de atuar conforme sua compreensão acerca da melhor forma de atender ao interesse público, ele violaria a lei. Essa atuação não guiada por esse dever poderia ser deduzida do fato de o comportamento no caso considerado não estar em harmonia com a concepção geral da comunidade, com a opinião comum vigente. Essa violação, contudo, nos primeiros escritos de Bernatizk, não dava margem à anulação do ato, mas apenas à responsabilização do agente. Vale dizer, fazia-se um controle disciplinar, mas não um controle jurídico de anulação do ato. Depois de repetidas críticas, Bernatzik acaba por reconhecer um controle jurídico de anulação do próprio ato.

As críticas à teoria de Bernatzik viriam de Tezner, que vai tachar a teoria dos conceitos discricionários de inimiga do Estado de Direito, eis que radicada na força autoritária do Estado monárquico absolutista austríaco. A teoria deste autor começa por negar a possibilidade de existirem conceitos com um significado absolutamente certo e determinado dentre os conceitos da ordem jurídica. É impossível a perfeita igualação entre conceito legal e fenômeno da vida real. Todos os conceitos normativos são conceitos jurídicos, sendo irrelevante a forma de determinação de seu conteúdo, se com base na experiência comum ou com base em certas ciências. A diferença entre conceitos legais determinados e indeterminados é apenas uma diferença do grau de insegurança da palavra; vale dizer, uma diferença de grau ou quantitativa, mas não uma diferença de qualidade. O problema dos conceitos legais indeterminados, argumenta, não precisa ser solucionada com a concessão de discricionariedade à Administração. O que importa, segundo essa compreensão, é que não há liberdade na Administração porque ela está sempre vinculada, em sua interpretação, a um interesse público específico. Nessa categoria, o interesse público, o legislador marca a medida que deve ser tomada como única legal. E como conceito ou categoria legal, que retrata fatos ou situações, o interesse público e sua qualificação são sempre atribuições do juiz. Os conceitos indeterminados não são considerados conceitos discricionários, mas conceitos jurídicos totalmente controláveis pelo órgão de controle, na sua interpretação e aplicação. Tezner não deixa de reconhecer que, sim, é possível haver mais de uma resposta diante de um caso concreto. Porém, em todo caso, o resultado da escolha poderia ser anulado pelo tribunal administrativo. Deveria, pois, ser afastada a compreensão de que a resposta cabe unicamente à autoridade administrativa. Segundo essa compreensão, só poderá ocorrer discricionariedade (i) na hipótese em que não exista um direito subjetivo particular à legalidade ou (ii) naqueles casos em que a lei estabelecer a incompetência dos tribunais para apreciar a matéria porque entende que a Administração está mais bem qualificada para definir a questão. Em suma, para Tezner os conceitos jurídicos indeterminados são critérios legais e, por isso, vinculantes para a Administração.9

“Este conflito doutrinário entre Bernatzik e Tezner [iniciado no século XIX] constituiu o ponto de partida do conflito doutrinário em que ainda hoje estamos envolvidos e que conhece duas grandes correntes: a teoria da duplicidade, com as suas raízes em Bernatzik, e a teoria da unicidade dos conceitos legais indeterminados, com suas raízes em Tezner, isto é, a teoria que diz que na interpretação e aplicação dos conceitos legais indeterminados são possíveis várias decisões certas e a que defende só existir uma solução correta”.10

Assim, enquanto parte da doutrina irá se alinhar à corrente da duplicidade, outra parte significativa da doutrina irá sustentar que a suposta discricionariedade concedida pelos conceitos indeterminados limita-se apenas ao plano abstrato, não, porém, diante de atos concretos. Logo, estes autores concluem que, diante do ato da Administração, somente se pode apurar se ele atende ou não ao conceito indeterminado normativo e abstratamente estabelecido, terceira possibilidade não há. Isso não significa que só existe uma solução possível para o caso, mas a necessidade de um juízo disjuntivo excludente acerca do ato praticado, ou seja, o ato atende ou não ao conceito indeterminado expresso na lei, não haveria uma terceira possibilidade, numa clara referência à lei lógica do terceiro excluído. Esse é o entendimento de Eduardo García de Enterría e Tomás-Ramón Fernández, que será bastante disseminado no Brasil.

La Ley no determina con exactitud los límites de esos conceptos porque se trata de conceptos que no admiten una cuantificación o determinación rigurosas, pero en todo caso es manifiesto que se está refiriendo a un supuesto de la realidad que, no obstante la indeterminación del concepto, admite ser precisado en el momento de la aplicación. La Ley utiliza conceptos de experiencia (incapacidad para el ejercicio de sus funciones, premeditación, fuerza irresistible) o de valor (buena fe, estándar de conducta del buen padre de familia, justo precio), porque la realidades referidas non admiten otro tipo de determinación más precisa. Pero al estar refiriéndose a supuestos concretos y no a vaguedades imprecisas o contradictorias, es claro que la aplicación de tales conceptos o la calificación de circunstancias concretas no admite más que una solución: o se da o no se da el concepto; o hay buena fe o no hay; el precio es justo o no lo es; o se ha faltado a la probidad o no se ha faltado. Tertium non datur”.11

Os conceitos indeterminados, assim compreendem os autores referidos, localizam-se no antecedente ou suporte fático da norma, enquanto a discricionariedade estaria no plano da consequência ou dos efeitos jurídicos.12 Logo, discricionariedade e conceito indeterminado não seriam expressões sinônimas, eis que a discricionariedade é a liberdade de decidir entre indiferentes jurídicos, enquanto o conceito indeterminado é um caso de aplicação da lei.

Essa compreensão, todavia, não atenta para a complexidade da norma de Direito Administrativo, em especial, não vislumbra que a norma que estabelece competência discricionária, no mais das vezes, segue o modelo meio/fim e não o esquema hipótese/consequência.13 Ademais, embora a tese pareça sedutora sob o viés lógico, ela deixa de observar o seguinte problema: em verdade, o que importa, sob perspectiva jurídica, é o fato de que, diante dos chamados hard cases e de conceitos indeterminados, não existem, muitas vezes, os necessários critérios objetivos de controle, sem os quais o juiz – ou outro órgão de controle – será incapaz de dizer se a aplicação ou não do conceito está correta apenas segundo o direito. Nessas condições, o controle passa necessariamente a ser exercido com a invocação de critérios subjetivos. Vale dizer, o critério de controle deve estar objetivamente fixado pelo direito e não depender de critérios e convicções pessoais do órgão de controle da ocasião. Afinal, os critérios de controle devem ser jurídicos, sob pena de violação ao princípio constitucional da separação de poderes (art. 2º da nossa Constituição).

Daí a razão pela qual, em nossa compreensão, não é possível concluir, em todos os casos de conceitos indeterminados, pela inexistência de discricionariedade para a expedição do ato administrativo. Parece-nos que é, no mínimo, questionável a incidência da lei do terceiro excluído na intelecção dos conceitos indeterminados, pois essa lei lógica é aplicável quando os símbolos são precisos, mas não quando os símbolos são vagos. Ou seja, justamente quanto aos conceitos jurídicos indeterminados a dificuldade reside em se poder assentar, mediante critérios objetivos, a incidência ou não do conceito. Afinal, como tautologicamente afirma Lendi, citado por António Francisco de Sousa, a interpretação correta deixa-se ambicionar, mas não é suscetível de ser alcançada. Os conceitos são, por isso, chamados de indeterminados, e não conceitos determináveis.14 As palavras de Andreas J. Krell, sobre esse ponto, são de extrema precisão, razão pela qual as transcrevemos:

“A aplicabilidade (ou não) do conceito legal a seus candidatos neutros [aqueles candidatos localizados na zona de vaguidade ou incerteza] não pode ser deduzida mediante um juízo silogístico “certo”. A sua incidência não é cognoscível para o aplicador através de um operação lógico-dedutiva, sendo a vaguidade justamente a da cognoscibilidade. Conseqüentemente, é o próprio intérprete do conceito que deve determinar a sua aplicabilidade na sua zona de incerteza, através do exercício de sua vontade”.15

Também não se trata, quando os conceitos indeterminados estão ligados ao suporte fático previsto na norma, de conferir à Administração a possibilidade de asseverar se o fato existe ou não.16 Cuida-se, em verdade, diante da equivocidade da previsão normativa da competência, da impossibilidade de se definir objetivamente qual é “a única solução justa” para o caso concreto apurado. Seria dizer, o fato é certo, mas não é perfeitamente certo e objetivo seu enquadramento legal à hipótese prevista mediante um conceito indeterminado. Em outros termos: é preciso diferenciar entre a “existência” do fato e a “valorização” de um mesmo fato. A aplicação automática da subsunção só se verificaria se os fatos e as correlatas previsões normativas correspondessem a situações simples. Contudo, em muitos casos, a tipificação dos fatos contém um grau de complexidade elevado, que corresponde à complexidade da realidade que regulam as normas incidentes.

Com efeito, prevalecendo a tese de que existe apenas uma solução justa na interpretação dos conceitos indeterminados, essa ideia teria que se apoiar em um conceito transcendental de justiça e verdade, numa fé absoluta da possibilidade de discernimento humano, idealismo esse de difícil aceitação, como assentam Miguel Sánchez Morón17 e César David Ciriano Vela.18 Seria como afirmar, por exemplo, sem qualquer vacilação, que se é capaz de discernir para todas as hipóteses possíveis o que é preço justo diante de cada circunstância concreta. Não por outra razão, Sérgio Guerra assegura que a única solução justa somente poderá existir num plano da filosofia pura, não se sustentando diante de todos os casos concretos e, por isso, os conceitos indeterminados se inserem na teoria da discricionariedade administrativa.19

Essa também é a razão pela qual também não acolhemos a distinção entre (i) “área de apreciação”20 na aplicação de conceitos indeterminados e (ii) discricionariedade. Não parece haver distinção de fundo entre os conceitos de discricionariedade e “área de apreciação”, eis que “[à] medida que compete à administração um espaço de poder discricionário ou de apreciação, ela tem o direito à ‘última decisão’.”21 Bem por isso, cada vez mais se postula a plena equiparação ou um “parentesco estrutural” entre discricionariedade e margem de apreciação na aplicação de conceitos indeterminados, impondo-se a esta os mesmos mecanismos de controle da discricionariedade administrativa e a mesma tipologia de vícios.22 Daí a assertiva de César David Ciriano Vela que a diferença entre a interpretação/aplicação de conceitos indeterminados e a discricionariedade não é qualitativa, mas somente de grau ou quantitativa.23 Com efeito, “a doutrina alemã da margem de livre apreciação trouxe de volta a discricionariedade para o âmbito dos conceitos jurídicos indeterminados, de onde ela tinha sido banida.”24

Mas não é só isso: o acolhimento da tese da unicidade implicaria uma virtual eliminação da própria discricionariedade em todas as hipóteses, não só quanto aos conceitos indeterminados. Explica-se: é que qualquer atuação administração estará guiada por ao menos um conceito jurídico indeterminado, talvez o mais amplo deles, qual seja, o de interesse público. Logo, esse conceito, segundo essa doutrina, coincide ou não com o ato adotado pela Administração no exercício de competência discricionária, não haveria terceira possibilidade e, por consequência, não haveria que se falar em discricionariedade.25 Todavia, a doutrina há muito reconhece que a discricionariedade compõe uma etapa necessária de concreção do ordenamento jurídico e que a Legislação é incapaz de eliminar toda a competência discricionária da Administração.  Segue-se, então, a impossibilidade de se assentar inexistir discricionariedade quanto aos conceitos indeterminados e, por consequência, a inexistência da própria discricionariedade. Temos, pois, que é correta a conclusão de Andreas J. Krell, quando afirma ser equivocada a tese de cisão completa entre as noções de discricionariedade e conceitos jurídicos indeterminados:

“Assim, parece equivocada a distinção rígida no tratamento do controle dos conceitos indeterminado – que exigem interpretação, sendo seu pleno controle judicial a regra – e, por outro lado, dos atos discricionários como decisões baseadas na conveniência e oportunidade, sindicáveis somente em casos de graves erros de avaliação e arbitrariedade. Muitas vezes, a questão não passa de uma contingência na formulação do próprio texto legal.

Na verdade, conceitos indeterminados e discricionariedade são fenômenos interligados, visto que, muitas vezes, o órgão administrativo deve lançar mão desta para poder preencher aqueles.”27

Parte da doutrina, porém, vale-se de outro recurso argumentativo para tentar evidenciar a univocidade dos conceitos vagos: a figura do chamado “legislador racional” com o fim de demonstrar que é sempre preciso encontrar o sentido querido por esse legislador racional. Tércio Sampaio Ferraz Júnior explica o fenômeno: o intérprete deve resistir o quanto possível a ideia de atribuir ou reconhecer um sem sentido na norma que aplica. Assim, procura, com a figura do legislador racional, compreender aquilo que foi desejado pelo legislador racional a partir daquilo que efetivamente está disposto no relato da norma. Isso também vale para a compreensão/interpretação dos conceitos vagos. “Incumbe ao intérprete, diante de textos vagos, ou aparentemente incoerentes ou irrelevantes, entender o que o agente ‘quis dizer’ (comunicar) muito embora isso não esteja claramente articulado no que ele ‘disse’ (i. e., no significado da sentença).”28

Nesse processo interpretativo, o jurista enfrenta vários problemas relativos à indeterminação das prescrições normativas. Diante desses problemas e da exigência de sistematização e coerência das codificações e decodificações, uma possibilidade de solução é a unificação das diversas codificações empregadas na legislação, que pode ter origens várias, mediante o recurso à figura de unificação da vontade do legislador no ideal do legislador racional, que é a figura-base para a fundamentação da atividade de interpretação dogmática do direito. Essa figura do legislador racional, no entanto, pode ser ela mesma estática ou dinâmica. Dessa forma, quando o recurso ao legislador racional favorece a previsibilidade, a segurança jurídica e a estabilidade do conjunto normativo, ela é estática. A figura do legislador racional será dinâmica quando for capaz de favorecer a operacionalidade das prescrições normativas, permitindo sua adaptação ao caso concreto.29 Ou seja, quando o intérprete se atém ao já proposto pela norma em ordem a prestigiar a segurança jurídica, a figura é estática; quando o intérprete propõe novos sentidos ao relato da norma, ele é dinâmico, assegurando que esses novos significados correspondem àquilo que o legislador racional faria diante daquela situação concreta.

Portanto, o recurso à figura do legislador racional não passa de argumento interpretativo para fazer extrair da lei o que efetivamente dela não consta – ao menos não consta de modo explícito – de modo a fazer crer que essa conclusão, que não estava, seja dita como algo que implicitamente estava previsto na norma, pois era querido pelo legislador racional. Mas é por meio dessa argumentação, que, em verdade, o intérprete realiza suas escolhas, valorizações e tomadas de posições ideológicas.30

O que se quer evidenciar pela referência a essa lição doutrinária é que a univocidade normativa não se soluciona com o problema de intenção de racionalidade. A linguagem jurídica sempre apresentará espaços para a intelecção de conceitos vagos. Não se resolve o problema da indeterminabilidade com recurso a uma suposta lógica racional implícita na interpretação desses conceitos legais. Em verdade, o recurso recobre uma tomada de posição ideológica:

“[N]o próprio recurso ao legislador racional reside uma determinada ideologia política segundo a qual somente ao poder legislativo, como representante do povo, cabe a determinação das soluções prévias para os conflitos dentro de uma comunidade, não sendo dado nem ao juiz, muito menos ao jurista (com uma função meramente teórica) modificá-las. Por meio desse instrumental a dogmática jurídica exerce um astuto poder paralelo, verdadeiro “poder de violência simbólica”, através do qual controla e uniformiza o ordenamento”.31

Logo, não há possiblidade de se argumentar a capacidade do magistrado para revelar a vontade pretendida pelo legislador racional como mecanismo eficaz para determinar, naquele particular caso concreto que se apresenta para apreciação, a vontade querida pela ordem jurídica, que se expressou por uma indeterminação no emprego de seus termos explícitos. Afinal, contra esse argumento poder-se-ia levantar com muito mais razão que melhor seria permitir ao intérprete-aplicador concreto – vale dizer, à Administração – a possibilidade de dizer diante do caso concreto qual foi a vontade pretendida pelo legislador racional. É que nessa hipótese, de revelação do conteúdo querido pelo legislador racional pela Administração, contaríamos ao menos com o dever de fundamentação das decisões administrativas, bem como pela vedação do excesso e, em especial, pela exigência de tratamento isonômico nos demais casos de ocorrência do conceito, além do respaldo democrático da chefia do Executivo que exerce a “direção superior da administração” (Constituição, art. 84, II). Ademais, essa compreensão estaria em melhor sintonia com a segurança jurídica do administrado, pois este contaria com a tranquilidade de que, não obstante a equivocidade da previsão normativa abstrata, será preservado o sentido empregado pelo organismo com capacidade de, com força executória, empregar a norma pela vez primeira, desde que essa opção possa ser justificada quando comparada com outras alternativas igualmente racionais, razoáveis e proporcionais, ou seja, quando cotejado com opções igualmente legítimas segundo a ordem jurídica.

Portanto, segundo nossa perspectiva, no que toca aos conceitos vagos ou imprecisos, é preciso, pois, compreender que os conceitos, embora indeterminados, possuem um campo significativo delimitado. Um conceito jurídico indeterminado não equivale a um completo sem sentido, ele não é um mero ruído. Logo, ao Judiciário caberá apreciar se a aplicação do conceito indeterminado pela autoridade administrativa competente pautou-se no campo razoável de compreensão desse conceito.32 Por isso, incide, em todas as hipóteses, o controle jurisdicional acerca do conceito indeterminado com o fim de apurar se a conduta adotada pela autoridade administrativa ateve-se ao campo semântico razoável do conceito indeterminado, em especial considerando a delimitação contextual em que empregado o conceito pela norma, diante das circunstâncias concretas e das possíveis consequências do sentido empregado pela Administração. Nesse sentido, calha a lição de Victor Nunes Leal, embora proferida em outro contexto:

“Não resta dúvida, porém, que a demarcação dessa zona livre é, em si mesma, uma questão jurídica, suscetível de apreciação jurisdicional. Não é à Administração mas à Justiça que compete a tarefa de verificar os limites do poder discricionário”.33

Entretanto, em determinadas hipóteses, ocorrerá a situação em que o juiz não será capaz de comprovar objetivamente que a escolha da Administração não se ajusta à compreensão razoável do conceito. São os casos nos quais Bernatzik fala de um limite além do qual não se pode verificar a exatidão da conclusão atingida e, assim, é possível verificar que outros são de opinião diferente, mas não podem pretender que só eles estejam na verdade ou que tenham uma opinião falsa.34 Ou seja, refere-se aos casos que estão localizados na “penumbra” do conceito: não estão localizados na zona de certeza positiva (onde o conceito certamente se aplica) nem na zona de certeza negativa (onde o conceito certamente não se aplica). Há uma repartição de competência entre a Administração e o Judiciário: enquanto a autoria do ato e a responsabilidade pela consecução do interesse público definido mediante conceito indeterminado cabem à Administração, ao juiz cumpre a fiscalização da conformidade do exercício da competência com as normas legais e os princípios jurídicos incidentes (juízo de “mera legalidade”). E aí se entrevê um quase paradoxo da questão do controle da discricionariedade da Administração. A questão é de discricionariedade, insindicável judicialmente, mas cabe tão somente ao Juiz fixar o limite da atuação administrativa discricionária.

Essa paradoxal relação, que aqui se expõe, aliás, é típica do Direito Administrativo, pois “o direito administrativo, desde suas origens, é constituído por uma série de paradoxos. O seu regime jurídico abrange prerrogativas que garantem a autoridade da Administração, e restrições, que protegem a liberdade e os direitos do cidadão.”35 Com efeito, como destaca Maria Sylvia Zanella Di Pietro, esses paradoxos são reflexos do binômio autoridade/liberdade, interesse público/interesse individual, que são o verdadeiro substrato do direito administrativo. Assim, também nesse aspecto, se apura que o ordenamento jurídico, ao mesmo tempo em que reconhece prerrogativas discricionárias à Administração, estabelece que o limite desse poder é fixado em lei e controlado judicialmente. Mas a existência de um controle jurisdicional final não significa transferência do poder discricionário da Administração para o Judiciário. Bem por isso, André Hauriou afirma que “não é pelo fato de o juiz controlar o administrador que este último perde o poder discricionário. O juiz verifica os limites estabelecidos pela regra de direito, não os criam.”36 Portanto, também há limites ao controle jurisdicional da Administração.

Em estudo sobre a indeterminação e a objetividade no discurso jurídico, Noel Struchiner elenca uma série de razões para sustentar o argumento de que o direito não é simplesmente o que afirmam os juízes em suas decisões. Assim, uma das razões apontadas pelo referido autor sustenta o seguinte: o simples fato de podermos afirmar que um certo juiz ao apreciar um determinado fato proferiu uma sentença equivocada em relação ao direito positivo é fato suficiente para demonstrar que o direito possui sentidos partilhados entre os membros da sociedade, não se reduzindo aos precedentes jurisprudenciais. Cabe transcrever o argumento, no qual faz um paralelo entre as regras jurídicas e as regras de um jogo de futebol:

“No jogo ‘discricionariedade do arbítrio’ a regra da pontuação é ‘aquilo que o arbitro determinar como sendo gol será um gol’. Nesse jogo não faria sentido falar que o arbitro estava errado na sua decisão. Não obstante, tanto no futebol quanto no direito, apesar de o juiz ter a palavra final, podemos afirmar que ele estava errado. Não é porque a sua palavra é a palavra final que ele será infalível. O simples fato de podermos afirmar que o juiz está errado demonstra que o direito não é meramente aquilo que os juízes decidem. A melhor explicação para a nossa capacidade de reconhecer o erro é a que a linguagem do direito possui um significado compartilhado e podemos, em um grande número de casos, afirmar que ele não está sendo observado”.37

Portanto, o fato de que cabe ao juiz a palavra final sobre a compreensão dos conceitos indeterminados não nos retira a capacidade de afirmar que o juiz foi além dos limites objetivamente desentranháveis de intelecção para firmar subjetivamente sua opção em detrimento da discricionariedade da Administração e, por consequência, com infringência ao princípio da separação de poderes. O direito, portanto, não se resume ao controle jurisdicional.

Retomamos, pois, conclusivamente quanto ao tópico, a questão da relação entre discricionariedade e conceito indeterminado. A posição, assim entendemos, não deve ser extremada: não há como afirmar que o conceito jurídico indeterminado não se relaciona de nenhuma forma com a discricionariedade, e também não cabe concluir que a presença de um conceito jurídico indeterminado é condição suficiente para a discricionariedade diante de todo e qualquer caso concreto. Nesse sentido, também a conclusão de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, que nega aos conceitos indeterminados a capacidade de configurar per se embargo ao controle jurisdicional, mas também afirma que, em determinadas hipóteses, especialmente no que toca aos conceitos de valor, os conceitos indeterminados vão fixar a competência da Administração para, segundo uma margem de apreciação, fixar a solução mais adequada à hipótese.

“Por outras palavras, a utilização de conceitos jurídicos indeterminados não pode, por si, servir de limite à apreciação pelo Poder Judiciário: a este cabe, primeiro, interpretar o conceito contido na norma, diante dos fatos concretos a ele submetidos. Se, pelo trabalho de interpretação, puder chegar a uma solução única que possa ser considerada válida, o juiz poderá invalidar a decisão administrativa que a contrarie.

Contudo, não vamos ao ponto de defender que em nenhuma hipótese o emprego de termos indeterminados na norma envolve certa margem de apreciação para a Administração escolher a solução mais adequada. Especialmente os chamados conceitos de valor podem garantir à Administração a possibilidade de escolher a melhor solução diante de cada caso concreto. Se assim não fosse, estaríamos admitindo a possibilidade de o Judiciário substituir a Administração Pública, tomando decisões que o legislador outorgou a ela”.38

Ao tratar dos conceitos indeterminados no campo específico da Administração econômica, Rolf Stober também evidencia a acerto dessa conclusão: em determinadas hipóteses os conceitos indeterminados garantem à Administração uma margem de apreciação que não poderá ser totalmente sindicável em juízo. O autor diz mais: no campo da prognose econômica não se admitem soluções inequívocas, razão da necessidade de que a questão seja apreciada em última instância pela autoridade administrativa, que detém competência especializada no trato da matéria.

“Os conceitos jurídicos indeterminados podem conter, simultaneamente, uma margem de apreciação, com a consequência de que a autoridade de Administração económica dispõe, do lado da previsão da norma, de uma margem de flutuação de decisão. Diferentemente dos simples conceitos jurídicos indeterminados, as margens de apreciação só limitadamente são controláveis jurisdicionalmente. Isso está ligado ao facto de a decisão de apreciação constituir um juízo de valor altamente pessoal, por conseguinte, irrepetível. Esta decisão assenta numa situação não compreensível ou não repetível por livre escolha, que deve ser apreciada em última responsabilidade ou em última vinculação por um órgão administrativo colegial de peritos, para o efeito designado. Um caso especial de margem de apreciação é a chamada margem de prognose, que visa sobretudo garantir decisões orientadas para o futuro no direito administrativo económico. Em oposição à margem de apreciação clássica, na qual é apreciada uma situação de facto existente no passado ou no presente, a margem de prognose diz respeito a uma apreciação de previsão de decisões económicas, que não admitem solução inequívoca”.39

Convém salientar, todavia, que a conclusão proposta não menospreza de forma alguma a influência da teoria da única solução justa para a compreensão dos conceitos indeterminados, especialmente no controle jurisdicional da discricionariedade administrativa. É fato que essa tese foi capaz de alargar e tornar mais profundo o controle jurisdicional da competência discricionária. A teoria fez ver que há certa distinção entre a chamada “pura discricionariedade” e a aplicação de conceitos indeterminados, de modo a autorizar um controle mais contundente sobre os limites de equivocidade dos conceitos indeterminados. Enfim, a teoria da única solução justa colocou às claras que era, sim, possível um maior controle sobre a compreensão dos conceitos indeterminados.40

Nada obstante essa marcante contribuição, a doutrina que consagra essa tese foi forçada a reconhecer que, sob determinadas circunstâncias, o controle jurisdicional era limitado. Eis mais uma nota da dificuldade em acolher na íntegra a tese da única solução: o paradoxo de reconhecer uma limitação ao controle jurisdicional, mas que recusa a admitir que a hipótese é de discricionariedade, bem como não indica os necessários mecanismos de controle para a hipótese.

“O paradoxo parece aqui evidente: se, por um lado, é dada uma resposta negativa à questão de saber se estamos perante um poder discricionário da Administração, por outro lado, admite-se que a decisão administrativa respectiva é insusceptível de controlo pelo juiz, o que equivale a passar um “cheque em branco” à Administração”.41

Portanto, apesar de sua marcante contribuição, temos por correto que, em determinadas circunstâncias os conceitos indeterminados serão capazes de, em razão da equivocidade de sua compreensão, conceder competência discricionária à Administração, na qual incidirão os respectivos mecanismos de controle.

 

1.2. Evolução: as divergências sobre a compreensão da discricionariedade técnica

 

A origem do termo discricionariedade técnica, como já indicado, deve-se a E. Bernatzik, que traça a primeira sistematização da teoria da duplicidade. Ele constatou que as situações previstas em alguns conceitos indeterminados empregados na lei só poderiam ser afirmadas depois de um complicado processo em cadeia, que chamou de discricionariedade técnica.

Embora tenha se originado no direito de expressão alemã, no debate sobre a existência de discricionariedade na definição dos conceitos legais indeterminados, o tema da discricionariedade técnica experimentou forte desenvolvimento no direito italiano, no qual se propôs a distinção entre discrezionalità tecnica e accertamento tecnico, conforme o nível de certeza oferecido pela ciência, técnica ou arte envolvida na definição do conceito.42 Assim, por exemplo, a definição do teor alcoólico de uma bebida é um accertamento tecnico, já a identificação de um determinado imóvel como patrimônio histórico poderá envolver discricionariedade técnica.43 No primeiro caso, trata-se de simplesmente acertar condições de fato consistentes em uma qualidade ou atributo de natureza técnica, razão pela qual não entra a questão da discricionariedade, diferentemente da última hipótese descrita. Segundo a doutrina tradicional italiana, a discricionariedade técnica seria a um dos perfis do mérito do ato administrativo e, por isso, não estaria, em princípio, sujeita a controle jurisdicional. Pietro Virga é um dos defensores da existência de uma discricionariedade técnica, que se afirma como uma margem de escolha administrativa infensa ao controle judicial.44

No entanto, essa forma de compreensão começa a ser contestada também no direito italiano. Alguns autores, a exemplo de Renato Alessi, vão sustentar que há direta correlação entre discricionariedade técnica e os conceitos jurídicos indeterminados que precisam, para sua aplicação, ser apreciados segundo critérios técnicos, excluindo-se, assim, os conceitos que são integrados por critérios da experiência comum.45 A diferença entre discricionariedade técnica e a chamada “discricionariedade pura” reside no fato de que nesta há uma eleição entre alternativas com a finalidade de satisfazer o interesse público, ao passo que na primeira recorre-se aos critérios técnicos para a apreciação de um fato delimitado por um conceito jurídico indeterminado. Ou seja, na discricionariedade pura há valor e vontade, já na discricionariedade técnica há apenas valor. Dessa forma, a discricionariedade técnica é um tipo de atividade que não deixa qualquer liberdade para a decisão. Os termos discricionariedade e técnica são, nessa perspectiva, inconciliáveis, pois ainda que seja complexa a tarefa de elencar os critérios técnicos, o que poderá eventualmente dar margem a opiniões diferentes, não se cuidará de escolha, de vontade; não se cuidará, portanto, de verdadeira discricionariedade.46

Ainda na doutrina italiana, Massimo S. Giannini entende que a discricionariedade técnica é um caso especial da teoria dos conceitos indeterminados, que requerem a aplicação de critérios técnicos para a sua execução. No entanto, entende que discricionariedade pura e discricionariedade técnica são termos nitidamente diferenciados, consistindo a primeira numa ponderação de interesses e numa eleição entre alternativas com a finalidade de satisfazer o interesse público. Já a segunda é mera atribuição da Administração para apreciar uma hipótese de fato delimitada por um conceito jurídico indeterminado mediante critérios técnicos.47

A posição aproxima-se da inicialmente defendida por Frederico Cammeo. Contudo, em seu Corso di Diritto Amministrativo reconhecerá que a discricionariedade técnica se afirmará não apenas pelo recurso à técnica para a compreensão de conceitos imprecisos contidos nas normas, mas evidenciará a necessidade de recurso também a critérios de oportunidade para uma decisão conforme o interesse público. Logo, a discricionariedade técnica não seria substancialmente diferente da discricionariedade “pura”, seria apenas mais limitada.48

Ao apontar para produções doutrinárias mais recentes na Itália, Eva Desdentado Daroca acaba por nos revelar que a questão é, em parte, revista, a exemplo da posição de V. Bachelet, segundo a qual a técnica não logrará eliminar um momento puramente político de eleição, em especial na regulação econômica e de finanças. É que as construções e os princípios de atuação nesses setores estão impregnados de valores e, em definitivo, de critérios políticos. Há uma influência da ideologia na definição da técnica.49

Desdentado Daroca traz também referência ao estudo de C. Marzuoli, segundo o qual o ordenamento jurídico em determinadas hipóteses concede de maneira reservada à Administração poderes de valoração técnica. Embora o autor italiano assegure que não se trata de discricionariedade, essas hipóteses escapariam ao controle jurisdicional. No entanto, não basta o caráter opinativo da técnica para excluir na hipótese o controle judicial; cumpre averiguar se a lei não pretendeu atribuir ao Judiciário a opinião final. A reserva de Administração, por sua vez, pode se revelar pela especialização da Administração sobre a matéria, pela participação popular na definição do conteúdo do ato administrativo ou ainda pelo maior número de opiniões colhidas no seio da Administração. Em cada caso é preciso avaliar qual é a intenção da lei, para apurar se ela deseja realmente que a decisão final fique a cargo da Administração. É preciso, enfim, captar qual é o sentido mais conforme à democracia e ao pluralismo. Esses seriam cuidados a serem observados para que a chamada discricionariedade técnica não se transforme em imposição.50

Sobre a jurisprudência dos tribunais administrativos italianos, André Felipe de Barros Cordeiro dá notícia de que o Conselho de Estado e os Tribunais administrativos regionais acenaram para a existência de uma “discricionariedade mista” na aplicação de conceitos técnicos opináveis, mas não deixariam tais conceitos de constituir critérios legais de controle. Seguindo a jurisprudência, a Lei italiana 205/2000, autorizou o Conselho de Estado a dispor de assessoramento técnico. Esse avanço para a discussão de questões técnicas, afirma o referido autor, gerou ferrenha crítica, que acusou o Conselho de Estado de infringir o princípio da separação de poderes. Contudo, adverte que o Código de Processo Administrativo italiano (Decreto legislativo 104/2010) admite, excepcionalmente, o controle quanto ao mérito administrativo (juízo de oportunidade e conveniência) da Administração. Não obstante a dicção legal, afirma que é comum localizar precedentes dos tribunais administrativos regionais nos quais o controle sobre a discricionariedade técnica é débil ou limitado.51 Note bem: o controle é feito por tribunal administrativo, a legislação permite o assessoramento técnico e, excepcionalmente, o controle de mérito. Ainda assim, vários dos precedentes admitem apenas um controle fraco, reconhecendo na Administração a competência para dar a última palavra nas questões de discricionariedade administrativa.

Após sintetizar o pensamento da doutrina italiana sobre a matéria, a autora espanhola Eva Desdentado Daroca conclui que a discricionariedade técnica poderá surgir em três hipóteses: (i) nos casos em que a lei concede discricionariedade técnico-administrativa, ou seja, quando a lei confere à Administração a prerrogativa de eleger as vias técnicas de atuação; (ii) quando a lei atribui à Administração o encargo de levar a cabo as bases científicas necessárias à expedição do ato, pois o estado da ciência empregada ainda não evoluiu o suficiente para apresentar a decisão final, ou ainda quando são necessárias atividades de prognoses; e, finalmente, (iii) quando a lei remete a critérios técnicos, nos quais a Administração necessariamente deve se socorrer de conhecimentos técnicos. Nos dois primeiros casos (i e ii), assegura que se verifica uma discricionariedade forte, mas no terceiro caso (iii) não haveria discricionariedade forte, mas apenas discricionariedade instrumental jurídico-técnica, de caráter puramente instrumental, na qual a decisão final caberia ao Judiciário, ainda que com o emprego de peritos.

Contudo, a autora reconhece que existe um acanhamento da jurisprudência espanhola em avaliar tais casos. Refere-se a precedentes do Tribunal Constitucional espanhol nos quais se assenta que, ressalvada a hipótese de desvio de poder, o que se impugna não é uma questão de legalidade, mas uma questão técnica, que escapa, portanto, ao controle jurisdicional. É que, segundo a compreensão do Tribunal Constitucional espanhol, as valorizações técnicas estão atribuídas aos órgãos administrativos especializados e sua revisão não cabe aos tribunais. Essa compreensão não implicaria ofensa ao princípio constitucional de plena submissão da Administração à lei e ao Direito ou ainda ao princípio de tutela judicial efetiva, pois que a jurisdição também conhece limites, um dos quais as questões de caráter exclusivamente técnico. Julgados mais recentes, contudo, vão fixar um controle mínimo de fundo, para apurar se existem dados de fatos objetivos que permitem deduzir a inaptidão da escolha da Administração. O Tribunal Constitucional espanhol acaba por reconhecer que o desenho constitucional é de máximo controle da Administração, mas existem algumas gradações, como o respeito à discricionariedade técnica dos órgãos da Administração. Essa limitação seria conforme a Constituição porque salvaguarda a competência legalmente atribuída à Administração e impede controles externos que não estariam amparados na estrita aplicação da lei, pois os critérios exclusivamente técnicos escapariam do universo jurídico.52

Eva Desdentado Dacora não admite a exclusão do controle jurisdicional sobre a discricionariedade instrumental técnico-jurídica (iii). Afasta, pois, o argumento de que o controle da discricionariedade técnica seria um controle para além dos parâmetros jurídicos. É que se uma determinada regulação remete a conceitos técnicos, estes conceitos passam a integrar o ordenamento jurídico, convertendo-se em parâmetros de legalidade. Logo, a concreção e aplicação desses conceitos técnicos é uma operação jurídica. A aplicação silogística dessa norma, ainda que exija para a formação adequada das premissas o recurso às ciências ou às técnicas, é uma operação jurídica. Ademais, o ordenamento prevê mecanismos para o juiz exercer adequadamente essa operação mediante o recurso às provas periciais e sua valoração conforme as regras da “crítica sadia”. A tarefa poderá ser complexa, mas é uma operação que os juízes podem e devem desempenhar.

A autora também não admite o argumento de que é irreversível a valoração técnica realizada pela Administração em razão de sua imparcialidade e especialidade. Primeiro porque a imparcialidade da Administração não pode ser comparada à judicial. Segundo, porque o argumento inviabilizaria a tutela jurisdicional efetiva, pois esse direito do administrado implica atribuição plena sobre os fatos litigiosos. Embora reconheça que a técnica nem sempre levará à certeza, essa margem controvertida das valorações técnicas não permite concluir que o tribunal deve necessariamente se inclinar favoravelmente à decisão da Administração. O juiz deve, pois, valorar a prova segundo as regras da “crítica sadia”, avaliar a menor ou a maior fundamentação científica de determinada conclusão, apreciar se a motivação da Administração apresenta-se racional e razoável. Por isso, a decisão judicial não está vinculada à prova pericial, nem ao juízo prévio da Administração: o controle cabe ao juiz. A falta de conhecimentos técnicos do juiz não é capaz de impedir uma valoração e uma “crítica sadia” das provas. Afinal, a prova não tem a função de revelar a verdade, nem a certeza; ela é empregada para o convencimento do juiz, o que se expressa mediante um juízo de probabilidade. A remissão legal aos critérios técnicos tem o propósito de ensejar a melhor decisão técnica, e não o arbítrio da Administração. A autora conclui que qualquer outro entendimento seria infringente à regra de amplo acesso à via jurisdicional.53

Não obstante essa contundente argumentação, ao final de sua obra admite que o controle pleno não é sempre possível, apurando-se em alguns casos um núcleo último de decisão do administrador. Mas essas hipóteses seriam constitucionais porque o controle foi tão longe quanto lhe era permitido pela Constituição. Esse núcleo último seria um produto da divisão de poderes e da configuração constitucional das funções. E esse núcleo último só se verifica nos casos de verdadeira discricionariedade. Vale dizer, nos casos em que a lei confere à Administração a prerrogativa de eleger as vias técnicas de atuação (i) ou quando a lei atribui à Administração o encargo de levar a cabo as bases científicas necessárias à expedição do ato (ii), pois o estado da ciência empregada ainda não evoluiu o suficiente para apresentar a decisão final, mas não nos casos de discricionariedade instrumental jurídico-técnica.

Esclarece, ainda, que haveria uma razão subjacente à jurisprudência favorável à exclusão do controle pleno em tais hipóteses: os tribunais se pautam por um critério de eficiência. Assim, admitido o controle, correriam o risco de ver sua atuação afogada em análises periciais com o acúmulo de assuntos no tribunal. Daí a política judiciária refratária ao controle da discricionariedade técnica. Mas essas certamente não são razões jurídicas, pois entende que as razões jurídicas avalizam o controle pleno, sem deixar de anotar que fazer efetiva as garantias que o ordenamento jurídico prevê resulta extraordinariamente complicado e encontra obstáculo na própria realidade e na natureza das coisas.54

O panorama sobre a origem e a evolução do conceito da discricionariedade técnica não revela univocidade quanto ao sentido empregado ou quanto ao regime jurídico incidente. Alguns autores admitem o controle total, a maior parte reconhece certa limitação ao controle incidente sobre a matéria. Em comum, no entanto, a relação do tema com a dos conceitos jurídicos indeterminados. Na sequência, passamos em breve revista alguns dos autores nacionais que trataram do tema em ordem a demonstrar a permanência das divergências apuradas desde a origem e evolução do instituto jurídico em apreço.

 

2. A doutrina nacional sobre a discricionariedade técnica

 

A notável obra de Luis Manuel Fonseca Pires, fundada em ampla pesquisa doutrinária, especialmente no que toca à teoria da interpretação jurídica, assegura que não há discricionariedade relacionada aos conceitos legais indeterminados. Assim, só pode concluir que não há discricionariedade técnica, sendo o controle incidente ilimitado.  Segundo o autor citado:

“(…) qualquer palavra ou expressão que reclame à sua compreensão de informações de outras áreas do saber humano igualmente não pode confundir-se com a discricionariedade administrativa. São necessidades de apreciações técnicas e científicas. São conceitos jurídicos indeterminados cuja busca de unidade de solução justa (Eduardo García de Enterría e Tomás-Ramón Fernández) depende de informes de outras áreas do conhecimento.

Toda e qualquer questão técnica e científica, em última análise, é irrestritamente controlável pelo Judiciário”.56

A avaliação de Carlos Ari Sundfeld e Jacintho Arruda Câmara, por sua vez, aponta em outro sentido. Afirmam o seguinte: em respeito à presunção de legitimidade dos atos administrativos, não se mostra possível que o juiz (ou outro órgão de controle), no exame fático, desconsidere fundamentos técnicos apresentados pela Administração em favor de argumentos contrários, também de índole técnica, levantados por particulares ou por auxiliares, como os peritos. Os autores consideram que se o juiz pode, sim, avaliar questões técnicas, não pode, contudo, tomar a si opções técnico-políticas. Assim, se há mais de uma técnica possível a seguir, a escolha entre elas cabe à discricionariedade da Administração. Essa é uma questão de mérito administrativo, acerca da decisão mais conveniente e adequada. O que não autoriza falar em ausência de controle, mas de limites ao controle. É uma tentativa de assegurar que o interesse público não sucumba diante da mera desconfiança a respeito da procedência do ato administrativo que o alberga. Perante o impasse, a única solução juridicamente plausível, por respeitar o sistema de aplicação e de controle dos atos administrativos, é manter a eficácia do ato impugnado perante o órgão de controle.

Especificamente sobre a concessão de provimentos cautelares pelo Judiciário, os autores asseguram que não é possível impedir, por decisão preliminar baseada apenas em polêmica de natureza técnica, a persecução de determinada política pública. Desde que haja fundamento técnico suficiente e adequado para a opção adotada pelo administrador, não haverá como rever sua decisão judicialmente, por não se tratar de matéria relacionada ao exame de legalidade. Enfim, segundo os autores:

“A existência de opiniões abalizadas divergentes apenas indica que, entre as alternativas em confronto, não sendo possível refutar de modo inquestionável qualquer uma delas, cabe à autoridade administrativa responsável decidir a respeito de qual adotar. O exercício desta competência de escolha envolve o que se convencionou chamar de discricionariedade técnica e não está sujeita a refutação por argumentos jurídicos; ou seja, não é matéria cuja responsabilidade possa ser atribuída a órgão jurisdicional, cuja função foi delimitada constitucionalmente ao campo do direito”.57

Portanto, segundo a compreensão desses autores, só a manifestação pericial peremptória será capaz de refutar o ato administrativo praticado.

Almiro do Couto e Silva, em artigo no qual defende a possibilidade de controle jurisdicional na correção de provas objetivas de concursos públicos, mostra-se bastante refratário ao reconhecimento de discricionariedade técnica. Contudo, admite que, quanto às provas subjetivas de concursos públicos, existe necessariamente, na generalidade dos casos, um espaço, uma “margem de apreciação” ou “área de apreciação”, e, nesses casos, o controle jurisdicional é limitado. O texto de A. Couto e Silva faz o seguinte questionamento: haveria discricionariedade concedida à banca examinadora do concurso público para considerar correta uma resposta incorreta ou, diversamente, para considerar incorreta uma resposta correta? A única análise a ser feita é sobre a correção ou não da resposta frente ao atual estado da ciência, da técnica ou das artes. O gabarito oficial deve retratar necessariamente com fidelidade essas circunstâncias. É tudo ou nada, sem espaço para meio termo. Já nas provas subjetivas a margem de apreciação é muito maior, pois pressupõe um exame comparativo. Uma segunda exceção ao controle ilimitado se apuraria quando, em razão da complexidade da matéria versada, o juiz não se considerar capacitado a afirmar se está correta ou incorreta a resposta dada como certa ou errada pela Administração Pública, representada pela banca, apesar dos pronunciamentos e dos esclarecimentos prestados pelos técnicos que se manifestaram no processo. De qualquer modo, assegura que o juiz só poderá chegar a essa conclusão por uma limitação cognitiva identificada ao final de um processo desenvolvido com a finalidade de apurar se a decisão administrativa  confere com o estado atual das ciências, da técnica e das artes.58

Em um dos textos mais completos da doutrina nacional sobre a discricionariedade técnica, César Augusto Guimarães Pereira, após discorrer sobre o pensamento de Dworkin e Alexy, cuida dos limites da racionalidade no discurso jurídico, e conclui que os conceitos indeterminados empregados na lei podem configurar uma forma de atribuição de discricionariedade no plano normativo, abstrato, portanto.

Uma proposta interessante do texto de Guimarães Pereira é a referência à lição de Paolo Lazzara. Segundo esse autor italiano, a definição da atividade discricionária da Administração depende da definição legal da situação jurídica subjetiva do administrado. Assim, a vinculação resulta das hipóteses em que a lei já disciplina o conflito de interesse sobre o bem da vida objeto da atuação administrativa, daí afirmar que nessas situações existem efeitos substancias ex lege para o administrado. Já na situação de atribuição discricionariedade, cabe à Administração competência para, por ato próprio, disciplinar esse conflito de interesses. A discricionariedade, portanto, caracteriza-se pela autonomia da Administração para a disciplina dos conflitos de interesses.

Esse critério, afiança o autor, pode se estender para as apreciações técnicas e os conceitos indeterminados. Um conceito indeterminado empregado pela lei para atribuir uma determinada garantia ao administrado gera vinculação para a Administração. O mesmo conceito indeterminado, se relacionado com a atribuição de autonomia, conduz à discrição para a Administração, ao menos no plano normativo. Assim, segundo o autor italiano, se a norma quer conceder direito subjetivo ao administrado, vinculação; se a norma quer atribuir autonomia à Administração, discricionariedade no plano normativo. Exemplificativamente: não é difícil imaginar que a norma que assegura ao administrado que o procedimento administrativo deverá respeitar o princípio do devido processo legal não tem a pretensão de conceder qualquer discricionariedade à Administração. No entanto, outra norma que diga que a Administração deve fixar prazo razoável para o recurso administrativo, segundo as regras do devido processo legal, já quer conceder, ao menos, uma zona de apreciação para a Administração.

César A. Guimarães Pereira assegura, por sua vez, que há pelo menos cinco fenômenos diferentes que são usualmente rotulados de discricionariedade técnica: (i) uma suposta liberdade da Administração para realizar exames e apurações técnicas e formular juízos especializados, de modo a preencher um conceito técnico referido na lei – nesses casos não haveria discricionariedade, pois o erro técnico é passível de correção pelo Judiciário; (ii) escolhas administrativas relacionadas com campos especializados de conhecimento – aqui se deve apurar se o conceito é empregado para regular o bem da vida ou foi deixado à Administração como instrumento para decisão própria (direito subjetivo versus autonomia); (iii) escolhas administrativas realizadas com base em apreciações técnicas, a chamada discricionariedade técnico-administrativa, casos nos quais o conhecimento técnico é pressuposto fundamental para avaliar a medida em face do interesse público, nesses casos haveria dois momentos, um técnico-vinculado e outro de escolha; (iv) situações nas quais a Administração é chamada a formular escolhas com base em hipóteses científicas que não tenham podido ser objeto de corroboração (atividades prognósticas) – esse é o caso em que realmente se apura discricionariedade, pois não há juízo técnico conclusivo, embora no caso concreto a discricionariedade possa ser reduzida a zero; e (v) sentido processual, que corresponderia à suposta liberdade da Administração na atividade instrutória do processo administrativo, nos casos em que a coleta de provas é complexa – aqui não há discricionariedade, pois não se admite autonomia quanto à comprovação dos fatos e quais fatos deveram ser comprovados.59 Após essa exposição conclui que seria melhor abandonar o conceito de discricionariedade técnica:

“O exame dos cinco casos isolados revela, desde logo, um ponto significativo: a expressão “discricionariedade técnica” é utilizada para denotar realidades absolutamente distintas. Há casos descritos como de “discricionariedade técnica” em que não há qualquer juízo discricionário, apenas uma apreciação técnica. Em outros, há discricionariedade, tal como em qualquer outra área da atividade administrativa, e sem que se possa vislumbrar qualquer peculiaridade da discrição neste campo em relação a qualquer outra. Assim, deve-se abandonar a expressão “discricionariedade técnica”.

Em vista disso, é mais adequado aludir-se a “apreciações técnicas” da Administração para denotar todos os casos em que houver recurso da Administração a sistemas específicos e especializados de conhecimento, para a formulação de juízos acerca de determinado fatos com base nos postulados técnicos e científicos próprios de cada setor do conhecimento”.60

Muito embora o autor chegue até mesmo a listar os casos de apreciação técnica que envolvem discricionariedade, ele conclui que não é possível reconhecer a existência de “discricionariedade técnica” como instituto próprio.61

Em outra perspectiva, a tese de Sérgio Guerra também afirmará a inexistência de um regime jurídico próprio da discricionariedade técnica. Em artigo no qual discute especificamente o tema da discricionariedade técnica das agências reguladoras, após analisar a doutrina nacional e alienígena, esse autor conclui que não existem correntes polarizadas acerca da discricionariedade técnica; ou seja, não se detecta uma uniformidade de linhas de pensamento acerca do tema em comento. O termo discricionariedade técnica, esclarece o autor, visa apenas uma limitação jurisdicional do controle de seu exercício, no sentido de evitar que as escolhas técnicas da Administração sejam substituídas pelas opções técnicas dos juízes. Não se identifica no ordenamento jurídico algum instituto aplicável à discricionariedade técnica como uma pseudoespécie da discricionariedade administrativa. Dessa forma, conclui que as entidades reguladoras não gozam de uma discricionariedade técnica na expedição de seus atos, mas, sim, de uma discricionariedade administrativa pura. Assim, se, para a integração de uma norma em decorrência de sua propositada abertura ou pela existência de conceitos jurídicos indeterminados e diante de técnicas conhecidas e disponíveis, o agente regulador identificar vários meios igualmente racionais, razoáveis e proporcionais para a consecução do fim público, resta indisputável que deverá selecionar aquele que, no seu juízo, seja mais oportuno e conveniente para o subsistema regulado.62

O debate em alguns autores passa, ainda, pelo tema da autonomia das agências reguladoras.63 Assim, parte da doutrina tem argumentado a necessidade de a competência discricionária ser reconhecida em favor das agências para expedir normas técnicas indispensáveis à regulação de determinados setores da economia. Exerceriam, pois, tais agências uma “regulação técnica”. A discricionariedade técnica, nesses termos, impossibilitaria o controle jurisdicional quanto aos aspectos técnicos da regulação, sob o argumento de que, sobre administração técnica, entende a administração, em razão de sua formação especializada.64 “[A] independência de grande parte delas [das agências] tornou-se corolário do alto grau de discricionariedade técnica de seus atos regulamentares que, destarte, se supunham politicamente neutros, se comparados com a atividade legislativa do Congresso”.65 A partir disso se construiu um dos fronts para a defesa da “independência” (rectius, autonomia) das agências reguladoras. É possível localizar na doutrina nacional quem sustente que o amplo poder normativo concedido às agências sustenta-se exatamente na competência discricionária técnica que lhes é concedida.66

Na complexa sociedade contemporânea, especialmente na regulação econômica, tornou-se indispensável a atribuição de competências regulatórias, mediante a estipulação de objetivos cuja fluidez, fixada em lei, é bastante elevada. Procura-se, a partir dessa constatação, justificar o recurso às entidades reguladoras autônomas com a finalidade de evitar a manipulação de sua atuação pelas forças políticas momentaneamente dominantes. Com efeito, o princípio majoritário não é sinônimo de democracia, mas apenas uma das formas de sua manifestação. Numa sociedade pluralista, efetivamente, recursos não majoritários são indispensáveis, inclusive como modalidade de preservação dos valores ligados às minorias. As agências reguladoras são colocadas nesse contexto como “órgãos ou entidades especializados, relativamente alheios ao comando político, seja administrativo ou legislativo, dotados de grandes poderes regulatórios, atuando principalmente com base em princípios gerais e finalidades gerais”.67

A questão que aqui queremos tratar, entretanto, diz mais de perto com a possibilidade de o argumento justificar uma dispensa de legalidade com fundamento na competência técnica e, desse modo, permitindo a concessão de espaços de discricionariedade à Administração. E, sob esse aspecto, parece-nos certo que a técnica, embora até possa oferecer espaços de discricionariedade juridicamente limitada, não deve servir de mote para a deslegalização ou atuação autônoma (alheia à lei) da Administração, como se apura na leitura dos autores a seguir referidos, que se detiveram no exame do tema no contexto norte-americano.

Com efeito, as agências reguladoras surgem para resolver um problema relativo à incapacidade dos parlamentares de responder por uma regulação complexa, técnica e detalhada. As casas parlamentares devem analisar, numa única sessão, diversos assuntos, muitas vezes não relacionados entre si, e ligados às mais diversas áreas do conhecimento. Desse modo é incapaz de torna-se expert em tamanha gama de temas: o parlamentar não passa de um “especialista em generalidades”. “Thus, it is said, Congress has a little hope of addressing urgent problems, much less comprehending the technical details, required to regulate the day-by-day activies of a modern economy. Agencies solve these problems”.68

Apreciando a matéria da discricionariedade técnica na perspectiva do Direito norte-americano e de suas agências reguladoras, Maria Sylvia Zanella Di Pietro explica que a ampliação de tarefas exigidas do Estado exigiu a ideia de especialização. Da especialização técnica decorria a ideia de neutralidade política, o que exigia a não ingerência político-partidária nos órgãos reguladores. A partir desses pressupostos, reconhecia-se ampla discricionariedade aos agentes reguladores. Esses três pilares do direito regulatório norte-americano – especialização técnica, neutralidade política e discricionariedade técnica – começam a se desgastar já nos anos 1960. Quanto à especialização, o enfoque não é mais o interesse do setor regulado, mas a proteção do interesse público. Embora a ideia de neutralidade não tenha sido abandonada, foi percebida a conexão das medidas com valorações políticas. Daí a necessidade de ampliação das exigências procedimentais para análise da relação custo/benefício (eficiência). Já no que se refere à discricionariedade técnica, ampliaram-se os mecanismos de controle jurisdicional com a aplicação dos princípios de motivação, racionalidade e razoabilidade dos atos normativos.69 Em síntese, embora se continue a reconhecer às agências competências normativas para disciplinar aspectos técnicos em sua esfera de atuação, o processo de elaboração tem que ser documentado com todos os dados pertinentes, além de respeitar as exigências de razoabilidade das normas ditadas pela agência diante dos standards indicados na lei.70

A exigência de maior controle sobre os atos das agências reguladoras no direito norte-americano é confirmada pelo estudo de Fábio Medina Osório, que, com apoio na obra de Chistopher Edley Jr., relata a evolução de determinadas técnicas de controle judicial da Administração Pública estadunidense, tais como as doutrinas do hard look ou adequate consideration, com alto grau de revisão das razões e explicações das agências. Mediante tais métodos procurar-se-ia construir uma “ciência do razoável”.71

Também Luís Cabral de Moncada confirma que já não se garante imunização às exigências da legalidade em favor das agências com fundamento na complexidade e na tecnicidade envolvida no trato da matéria. Assim, paulatinamente, nos dias atuais, o Parlamento e o Judiciário vão recuperando seus espaços na delimitação e controle dos atos das autoridades administrativas norte-americanas, pois já se perdeu a fé nas virtudes dos atos normativos editados pelas autoridades administrativas especializadas.72 Assim, tornou-se corrente a afirmação que a delegação de poderes às autoridades administrativa depende da fixação de limites quanto aos fins a serem atingidos pela atuação regulatória, bem como a fixação de um programa de delegação. Ou seja, devem ser fixados purposesguide standards intelligible principle, sob pena de as normas porventura emitidas sem esse amparo legal serem declaradas void. A Suprema Corte norte-americana tem exigido que a transferência de poderes contenha a “determinabilidade” necessária ao exercício adequado do judicial review das normas elaboradas pelo Executivo. Ademais, o direito norte-americano preocupa-se com o procedimento de feitura das normas, que deverá observar as exigências do due process, o que faz com que a participação popular (hearing) nos procedimentos normativos (rule making procedure) somente possa ser dispensada quando se mostrar impraticável, desnecessária ou contrária ao interesse público.73

O relato da experiência norte-americana e a indicação das amplas exigências que se ergueram para prevenir a exacerbação da discricionariedade técnica são importantes para firmarmos a posição de que não é possível uma cisão completa entre técnica e política. Não há neutralidade que justifique o afastamento dos parâmetros legais ou que seja capaz de imunizar, por completo, a atividade de determinado órgão contra o controle jurisdicional. Não há possibilidade de cindir, por completo, atividade técnica e administrativa do Estado. Os rumos do Estado devem necessariamente ser fixados pela vontade política expressa pelo povo e não apenas por burocratas do Governo.74

A conclusão positiva acerca da existência da discricionariedade técnica, portanto, não deve levar ao erro de se supor que a controvérsia, por se tratar de questão técnica, não merece tratamento legislativo ou, pior ainda, está entregue à livre atuação da Administração, imunizando-a por completo do controle jurisdicional. Muito ao revés, a conclusão é de que a outorga de competência à Administração, em quaisquer hipóteses, aí incluída a de discricionariedade técnica, exige parâmetros legais, seja para estabelecer qual a solução técnica a ser aplicada, seja para reconhecer que a melhor decisão para os casos concretos será objeto de apreciação, amparada em estudos técnicos, pela Administração. Ao Judiciário, por sua vez, sempre cumprirá – inclusive por força da determinação contida no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição – apreciar se a atuação administrativa ateve-se aos limites legais, bem como, em razão da incidência dos princípios constitucionais correspondentes, elaborar juízo sobre a racionalidade, a razoabilidade e a proporcionalidade da solução adotada.

Após a exposição desse panorama doutrinário nacional, podemos avançar para tentar elaborar uma teoria da discricionariedade técnica e sobre os limites e possibilidades de seu controle.

 

3. Teoria da discricionariedade técnica

 

Neste ponto do estudo, é possível, pois, constatar um breve consenso entre as diversas lições doutrinárias já referidas: elas evidenciam que, sobre os aspectos exclusivamente técnicos ¬– não controvertidos – das atividades administrativas, em verdade, não há discricionariedade. Portanto, sob qualquer prisma que se aborde a questão, se a matéria não é controvertida ou opinável, não se tem espaço para juízos discricionários pela autoridade administrativa. No entanto, quando a técnica está unida a fatores não nitidamente técnicos ou os fatores técnicos não são precisos, já se pode falar numa competência discricionária, justamente porque a questão foge da simples técnica.75

Segundo a lição de Celso Antônio, pouco importa a forma de juízo da Administração – se intelectivo ou se apenas volitivo – para determinar a compreensão de um conceito indeterminado acolhido na legislação. Essa diferenciação não cabe ao menos perante o Direito, que é a realidade que importa ao jurista, por isso assegura que a noção de discricionariedade não se restringe apenas ao campo da conveniência e da oportunidade, mas envolve necessariamente a intelecção de conceitos vagos.76 A questão não é exclusivamente técnica ou, mais precisamente, a técnica não oferece resposta assertiva (all or nothing) e, portanto, verifica-se certa discricionariedade concedida à Administração. Assim, somente nesses casos nos quais os conceitos técnicos empregados pela lei são controvertidos ou opináveis, pode-se falar em discricionariedade, pois remanesce em favor da Administração a possibilidade de intelecção para a definição da medida que melhor atende ao interesse público. Nos demais casos, os exclusivamente técnicos, cabe à Administração decidir conforme as condições técnicas já previamente definidas em lei e não valorar.77

Técnica e discricionariedade estão em relação inversa: quanto menor a precisão da linguagem técnica empregada, maior será a discricionariedade da Administração; inversamente, quanto maior a precisão da técnica envolvida, menor a discricionariedade da Administração.

Com efeito, nas hipóteses em que os conceitos indeterminados empregados pelas normas possuem alto grau de imprecisão, derivado de seu caráter valorativo (ou polêmico ou, ainda, cientificamente não comprovado), maior será a discricionariedade. Contudo, em outras hipóteses, a norma poderá oferecer critérios adicionais de compreensão do conceito, o que, certamente, reduzirá o espaço de atuação discricionária da Administração.78 A referência à lição doutrinária de Agustín Gordillo ajuda a compreender o argumento: só há discricionariedade quando a técnica ou ciência não se mostra suficiente para apresentar de forma objetiva a melhor solução ou a solução ótima para o caso concreto:

Por fin, la discrecionalidad que las normas jurídicas otorguen al administrador no significa que éste pueda actuar en contra de las reglas de la técnica, cuando éstas sean claras e uniformes

En este aspecto es preciso distinguir entre reglas estrictamente técnicas – indiscutibles e indiscutidas, por lo general – y aspectos técnicos susceptibles de controversia. En el primer caso, si desde el punto de vista de la técnica lo que la administración ha hecho o pretende hacer es indubitablemente erróneo, la actividad administrativa será ilegítima; en cambio, si se trata de cuestiones técnicas en las que cabe admitir la duda y los mismos técnicos no están de acuerdo en cuál es el criterio correcto, entonces la libertad del administrador es más amplia y su conducta no será ilegítima por haber elegido una de las posibles vías técnicas.

En suma, la actividad técnicamente errada es sólo por ello antijurídica, aunque que no hubiera normas legales o reglamentarias que regularan dicha actividad”.79

A lição de Oswaldo Aranha Bandeira de Mello também revela a necessidade de distinguir conceitos técnicos precisos ou rígidos e conceitos técnicos flexíveis ou elásticos. O insigne autor declara que não se pode falar propriamente em discricionariedade técnica, eis que é preciso apurar antes se os critérios técnicos são suficientes ou não para determinar, de forma objetiva e vinculada – justamente porque eles são precisos – o comportamento da Administração. Nas palavras do autor:

“[N]ão se pode falar propriamente em discricionariedade técnica. Esta [a técnica], na verdade, elucida a atividade administrativa ou coopera para o seu bom desempenho. Os requisitos ou elementos técnicos podem ser de natureza flexível, elásticos, ou ao contrário de caráter rígido, precisos. Naquele caso deixam margem à apreciação subjetiva de autoridade administrativa, enquanto neste estabelecem dados objetivos para o seu exame. Então, em um caso a técnica faculta poderes discricionários, enquanto em outro prescreve poderes vinculados”.80

Verifica-se, nesse passo, que não basta argumentar que técnica e discricionariedade são termos inconciliáveis. Na chamada discricionariedade técnica, revela-se a insuficiência dos conhecimentos técnicos para revelar a solução ótima a ser adotada pela Administração. O argumento da técnica, portanto, não se mostra, por si só, como razão suficiente para justificar uma atenuação nas exigências da legalidade e de controle jurisdicional, pois que é justamente quando não se apura mera técnica que se justifica a atuação das autoridades administrativas a veicular uma opção discricionária quanto ao ponto controvertido e, portanto, não exclusivamente técnico – daí a razão desse “amalgama de conceitos antitéticos”.81 Por isso, o recurso à ciência ou à técnica se justifica para a caracterização dos elementos ou situações já previamente indicados na lei por conceitos indeterminados. Significar dizer, recorre-se à ciência para delimitar o sentido dos conceitos legais. Em tais casos, verifica-se como que uma conjugação de técnica e discricionariedade, pois entram em pauta tanto fatores técnicos quanto fatores de conveniência e oportunidade.82

Em geral, nos casos em que a técnica ou a ciência empregada revela insuficiência para determinar de modo vinculado o comportamento da Administração, verificam-se três passos a serem observados pela Administração: (1) apuração e delimitação das vias técnicas de solução; (2) ponderação e escolha da via técnica mais ajustada ao interesse público; e, finalmente, (3) a execução da opção. No primeiro passo, recorre-se à ciência, no segundo faz-se a opção discricionária, que será executada no terceiro passo.

Aliás, convém reconhecer que no domínio da atividade regulatória da Administração, a existência de conceitos técnicos que não oferecerem grandes zonas de certezas (negativa e positiva) é bastante comum. Uma das características das atividades reguladoras é a grande quantidade de normas técnicas, que, com frequência, remetem aos conceitos de outras ciências. Mas é no mínimo questionável se a ciência, em particular a econômica, é capaz de fornecer critérios unívocos de solução. Lembremo-nos, ainda que na atividade regulação é bastante frequente o uso de juízos prognósticos, que raramente oferecem critérios objetivos e seguros.

Para além dos problemas relativos às dificuldades para se construir uma ciência mais objetiva cabe lembrar que há uma constante revisão dos paradigmas científicos pela própria ciência. Fato que decorre até mesmo da necessidade de aprimoramento do próprio estudo. Portanto, a concreção desses conceitos incorporados aos textos legais é, muitas vezes, incerta e opinável. Nesses casos, segundo Miguel Sánchez Morón:

[S]alvo crasos errores de apreciación, no sería conforme el derecho sustituir la opinión de los técnicos de la Administración por la que el juez pueda formar-se en el proceso oyendo a otros técnicos distintos. De lo contrario, se estaría trasladando la discrecionalidad técnica de la Administración a lo jueces”.83

Nesse sentido, a tomada de decisão regulatória importa, muitas vezes, num juízo de verniz mais político. Por aí se entrevê que o chamado Direito Administrativo Econômico acaba por favorecer, de certo modo, a discricionariedade da Administração Pública ordenadora. Com efeito,

en el Derecho administrativo económico actual existen unas circunstancias especiales que favorecen la necesidad de que el principio de legalidad deba operar de un modo flexible (…), que refuerzan el alcance de las potestades discrecionales y dificultan el control judicial de la Administración económica”.84

Em verdade, talvez o fenômeno seja até mesmo mais amplo, não se localizando apenas no chamado Direito Administrativo Econômico. Com efeito, hoje, na complexa sociedade contemporânea, o direito caracteriza-se como um direito por princípios. Com efeito, os princípios jurídicos assumem particular importância na atualidade, pois correspondem às exigências de maior relatividade e gradualidade, típicas das sociedades contemporâneas. Confere-se, pois, à Administração um papel mais dinâmico, criativo, especialmente na concretização de políticas públicas. Assim, as normas que atualmente disciplinam a atividade administrativa assumem um caráter tendencialmente mais aberto, favorável à discricionariedade da Administração.85

Em parecer no qual aborda o poder normativo das agências reguladoras, Sérgio Guerra também destaca a indispensabilidade de se conceder liberdade ao administrador – trata, na peça opinativa, especificamente das agências reguladoras – para a execução de normas que, muitas vezes, não vão trazer mais que linhas mestras de política econômica. Daí que a decisão, em muitos casos, dependerá de uma apreciação técnica pela autoridade competente. Não por outra razão, explicitamente, declara a imprescindibilidade de um regramento maleável a permitir que as autoridades reguladoras gozem das prerrogativas indispensáveis à preservação dos interesses públicos ligados ao subsistema regulado.86

Essa exigência de flexibilidade realmente não passou despercebida pela doutrina, a qual destaca que a previsão por normas de conteúdo mais rarefeito também está intimamente ligada ao fenômeno de “juridicização” da vida social, típica da concepção contemporânea do Estado Democrático de Direito. “Nestas condições, alargou-se o domínio material da legislação, mas não se conclua daqui que por assim ser se expandiu do mesmo passo a presença da lei em sentido formal”.87 A expansão do Direito sobre setores que, até então, eram-lhe estranhos, ou entregues simplesmente à livre iniciativa, só se tornou possível em decorrência da criação de um direito mais consensual e menos coativo, fato que ensejou, também por essa via, a ampliação da discricionariedade, técnica ou não. Nesse sentido, a lição de Alexandre Santos do Aragão:

“Diante das grandes demandas postas pelo Estado Democrático de Direito e pelo dinamismo da realidade sócio-econômica, o direito administrativo econômico tem-se guiado preponderantemente por princípios, programas e objetivos genéricos a serem realizados. Nesta perspectiva, as normas tornaram-se um dos meios necessários para que determinadas finalidades públicas sejam alcançadas, em relação às quais são instrumentais.

Para isto, como ensina Cabral de Moncada [Direito Económico. 2ª ed. Coimbra: Coimbra editora, 1988, p. 56, 57 e 405], a aplicação dos instrumentos do direito público da economia está normalmente prevista em normas flexíveis, consistentes, por exemplo, em cláusulas gerais, comportando um elevado grau de discricionariedade técnica por força do alto grau de tecnicização e especialização das suas normas, sempre variáveis segundo a conjuntura sócio-econômica diante da qual são prospectivadas.

O ponto comum a todas estas normas é o fato de trazerem para a regulação jurídica elementos próprios da Economia, elementos que constituem objetivos atributivos de uma ampla margem de apreciação de índole não apenas política, mas também marcadamente técnica, aos órgãos e entidades reguladores incumbidos da sua persecução. Esta espécie de normas propicia, então, a penetração no Direito de noções exógenas, próprias de outros subsistemas, em especial da Economia”.88

Entretanto, sob outra perspectiva, a regulação também exige previsibilidade. Rolf Stober explica que o direito alemão positivou no art. 103, nº 2, da Lei Fundamental e, especificamente para os atos administrativos, no art. 37, nº 1, da Lei do Procedimento Administrativo, o princípio da determinação, que impõe que todas as leis devem ser suficientemente determinadas quanto ao seu conteúdo, objeto, fim e medida. Essa, aliás, é uma exigência do princípio do Estado de Direito. O legislador é, pois, obrigado, quando autoriza a atuação administrativa, a limitar suficientemente as opções da Administração, com a finalidade de evitar o arbítrio. Desse modo, assegura-se que as normas e atos administrativos devem ser claros e passíveis de questionamento pela via jurisdicional na hipótese de se desviarem dos preceitos jurídicos. Não obstante essas determinações, a doutrina reconhece que, nas questões relativas ao Direito Administrativo Econômico, o legislador não pode prescindir do recurso a cláusulas gerais e aos conceitos jurídicos indeterminados, com suas tipificações e generalizações.89

Nesse passo, não é demais lembrar que as agências reguladoras foram criadas no Brasil também com a finalidade de instituir um regime jurídico confiável, propício para o investimento privado nos setores desestatizados. Daí que se advogue em favor desses órgãos reguladores do domínio econômico a manutenção das decisões adotadas com finalidade de garantir a segurança dos investimentos privados. Assim, procura-se imunizar, em parte, o ato administrativo da revisão judicial, especialmente no caso de decisões dotadas de alta tecnicidade. Afinal, uma constante revisão pelo Judiciário, nessa perspectiva, poderia configurar um fator de instabilidade jurídica e, em especial, de insegurança para os investimentos privados que se procura atrair.90

A flexibilidade referida, portanto, esclarece, em grande medida, porque na regulação administrativa, notadamente de setores econômicos, aquela conjugação entre técnica e discricionariedade – essa “amálgama de conceitos antitéticos”91 – seja tão característica. O aparecimento de hipóteses daquilo que se imagina seja um tipo de discricionariedade técnica será ainda mais constante do que nos casos em que a lei simplesmente remete a solução para os conceitos de outras ciências, a exemplo das ciências físicas ou químicas. Gaspar Ariño Ortiz faz referência a essa ideia ao afirmar que “toda regulación económica tiene elementos de discrecionalidad en su aplicación”. Isso porque “los problemas que el regulador aborda no tienen una única solución justa prevista en la norma, sino que responden a opciones y apreciaciones, que hay que hacer en cada momento, sobre cuál sea el interés público prevaleciente”.92 E assim é porque, de fato, a ciência econômica refere-se a conceitos de valor e não a conceitos experimentais, o que favorece a indeterminação da linguagem empregada. Vale-se, assim, necessariamente de uma linguagem não formalizada.

Portanto, é preciso assumir que a adoção de cânones do procedimento científico não afasta, no mais das vezes, a referência a valores. E justamente porque os conceitos econômicos referem-se a valores é que o autor espanhol antes aludido, Ciriano Vela, conclui que, na aplicação de conceitos econômicos, não há discricionariedade técnica, mas há verdadeira discricionariedade política, eis a razão pela qual as decisões competem ao órgão encarregado de zelar pelo interesse público. Existe, sim, o assessoramento técnico a subsidiar a decisão, mas o valor dessas considerações técnicas é, muitas vezes, apenas relativo. Não é a posição técnica, mas a política que justifica a discricionariedade. Assim, quanto menor a precisão técnica da norma, decorrente de sua referência a valores, maior será a discricionariedade da Administração.93 Conclui, então, Ciriano Vela, que:

(…) en lenguaje, y más todavía en el ámbito administrativo económico, emplea en muchas ocasiones conceptos que contienen elementos valorativos (conceptos de la Ciencia económica, términos que implican una valorización o ponderación entre distintos valores o intereses, etc.). Aquí la interpretación que se haga de los conceptos, si las normas non son más precisas, en todo caso encierra un grado de indeterminación, de modo que en realidad las soluciones posibles son muy variadas, en función del intérprete, que en una sociedad pluralista como la nuestra permite la aprehensión distinta de la realidad cuando se trata de realizar valoraciones (por ejemplo, el concepto de “desarrollo económico”, o el de “intereses de la economía nacional” o “protección adecuada del medio ambiente”, o “economía de mercado”, etc.). De ahí que en estos casos, hasta los defensores de esta teoría [da única solução justa para os conceitos jurídicos indeterminados], como GARCÍA DE ENTERRÍA y SAINZ MORENO, han admitido que existe un margen de apreciación en manos de la Administración, mayor o menor en función de las circunstancias concurrentes en el caso en cuestión”.94

Até mesmo a atividade sancionadora da Administração Pública na regulação administrativa, que por muitos é apontada como exemplo de atividade vinculada.95 poderá autorizar juízos discricionários. Basta lembrar que, não raro, as hipóteses fáticas previstas para a aplicação das sanções são feitas com remissão a conceitos jurídicos indeterminados – “aumentar arbitrariamente os lucros” –; outras vezes, na fixação de hipóteses de majoração da pena a ser fixada, também se faz referência a conceito indeterminado – “gravidade dos fatos ou o interesse público em geral”.96 Isso sem cogitar da discricionariedade inerente à graduação das penas aplicadas. Essas referências comprovam que, mesmo na atividade sancionadora, não será possível a desconstituição completa, mediante critérios objetivos, do juízo da Administração.

Ainda na seara do direito administrativo sancionador, também é possível vislumbrar discricionariedade administrativa, mediante o exercício da competência regulamentar, para a definição das infrações (tipificação da norma primária) das sanções administrativas pelo descumprimento da própria norma regulamentar. Afinal, se a pena é aplicada pela não observância de regulamento, é neste ato regulamentar que está definido o comportamento infrator. Quanto ao tema da sanção administrativa pela infringência de regulamentos, portanto, requer-se, por certo, a tipificação da sanção (consequente) na lei formal regulamentada, admitindo-se certa remissão ao regulamento para a previsão da conduta ilícita (infração), respeitado, no entanto, sempre, o princípio da determinabilidade, não se tratando de exigências tão rígidas quanto a da tipicidade penal.97 Logo, também há espaços para juízos discricionários.98

Daí a conclusão no sentido de que é possível, sim, referirmo-nos à existência de uma discricionariedade técnica, que está relacionada à indispensável previsão legal mediante o recurso a conceitos flexíveis ou fluidos de outras ciências, em particular da ciência Econômica. Cuidar-se-ia de uma discricionariedade parcial ou incompleta, pois “no hay en absoluto una completa discrecionalidad en materia técnica”, e até mesmo porque “hoy en día todo acto es en su mayor parte reglado y sólo parcialmente discrecional”.99 Portanto, essa discricionariedade técnica, ao mesmo tempo em que limitaria o controle jurisdicional, não seria capaz de imunizar, por completo, o exercício dessa competência do controle jurisdicional sobre o emprego do conceito previsto pela legislação.

Outro ponto a destacar é que não estamos a afirmar que a escolha de conceitos técnicos controversos constitui opção deliberada do legislador para conceder prerrogativas discricionárias à Administração. Afinal, a complexidade do sistema representativo e as diversas correntes antagônicas que compõem o processo parlamentar, no mais das vezes, dificultam a possibilidade de localizar nessas hipóteses a verdadeira intenção do legislador no emprego de tais conceitos.100 Em verdade, a limitação está na impossibilidade de desentranhar desses conceitos critérios objetivos de controle dos atos administrativos expedidos no exercício de função prevista com recurso a conceitos técnicos controversos.

Estabelecida a premissa de que existe uma forma de discricionariedade técnica ligada à intelecção de conceitos indeterminados empregados pela Legislação ao estabelecer as competências da Administração, cabe questionar em que sentido essa forma de discricionariedade difere da discricionariedade ordinária, ou discricionariedade pura, como preferem alguns dos autores já referidos neste estudo.

É certo que o regime jurídico – em especial no que toca ao controle jurisdicional – é idêntico ao da chamada discricionariedade pura. A discricionariedade técnica não caracteriza exceção ou forma diferenciada de aplicação do regime de legalidade que incide sobre a Administração.

Se assim é, cabe manter a expressão “discricionariedade técnica”? Afinal, se, como vimos a afirmar, pouco importa a forma de intelecção da Administração Pública – se volitiva ou intelectiva –, qual é o sentido jurídico da expressão discricionariedade técnica? A manutenção da expressão discricionariedade técnica se justifica para marcar que a hipótese de exercício da competência discricionária exige motivação amparada em argumentos de índole técnica. Não pode, pois, a Administração se furtar, em hipóteses de discricionariedade técnica, de explicitar as razões técnicas de sua decisão. Há deveres especiais de motivação. Cumpre à autoridade competente declinar as razões de sua decisão, com amparo não apenas em juízo subjetivo acerca da conveniência e oportunidade da medida adotada, mas também lhe cabe o dever de explicitar as razões de ordem técnica de sua opção, louvando-se na ciência e nos métodos científicos. Caso contrário, a decisão revela mero capricho, juridicamente injustificável. Cabe dizer: a discricionariedade técnica se notabiliza pela forma de exercício, que reclama necessariamente fundamentação ancorada em razões de índole técnica.101

A forma de exercício da discricionariedade técnica demanda necessariamente a ponderação sobre razões técnicas antes da tomada de decisão política (discricionária). A discricionariedade técnica remete à teoria dos conceitos jurídicos indeterminados, mas a um tipo especial de conceito indeterminado, que é a previsão legal mediante a referência a termos científicos controvertidos ou opináveis, notadamente termos oriundos da ciência Econômica. Esses conceitos abertos, uma vez definida a regra de competência subjetiva, podem estar presentes em qualquer dos demais elementos que compõem a norma de direito público completa, valer dizer: (i) o pressuposto de fato para a atuação administrativa; (ii) o consequente da norma; (iii) o meio a ser utilizado pela Administração para o atendimento do interesse público; (iv) a concretização ou especificação do interesse público (fim) a ser atendido; (v) no elemento temporal para atuação (discricionariedade tática); e, por fim, (vi) a definição do procedimento administrativo que será observado para a tomada de decisão. Com efeito, em qualquer desses elementos pode a previsão legal dar-se de forma fluida, indeterminada ou aberta, a exigir a concretização pela Administração.102

A discricionariedade técnica refere-se, pois, à necessidade de a Administração recorrer a outras ciências para determinar o campo semântico de um conceito legal indeterminado. Portanto, pode ser definida como dever da Administração ou daquele que exerce função administrativa de ponderar, segundo os cânones técnicos e científicos pertinentes, mediante determinado procedimento e em determinado prazo, para, em seguida, indicar qual é o comportamento, de pelo menos dois admitidos pelas normas incidentes no caso concreto, que melhor atende à finalidade da lei, que lhe atribuiu dita competência, submetido a controle judicial e extrajudicial. Em outras palavras, é a prerrogativa da Administração de completar uma norma imprecisa no processo aplicativo tendo por base a existência de uma habilitação legal inacabada ou aberta, precedida de avaliação com recursos a conceitos técnicos ou científicos opináveis.103

Em qualquer hipótese, deve a Administração motivar sua decisão. Quer dizer, deve documentar em procedimento a tomada de decisão para evidenciar que foram observados os seguintes pressupostos para a tomada de decisão discricionária: (1) apuração e delimitação das vias técnicas de solução; (2) ponderação e escolha da via técnica mais ajustada ao interesse público; e, finalmente, (3) a execução da opção. Como dito, no primeiro passo recorre-se à ciência, no segundo faz-se a opção discricionária, que será executada no terceiro passo.

Portanto, a afirmação de que o ato envolve o exercício de competência ancorada em discricionariedade técnica fará surgir deveres especiais de fundamentação. Por isso, uma vez impugnado o ato ou o regulamento editado no exercício de uma competência discricionária com remissão a conceitos técnicos fluidos, será imperativo que a Administração traga aos autos do processo judicial a prova de que efetivamente exerceu o juízo técnico indispensável à prévia edição do ato. É a motivação do ato que colocará luzes sobre a forma como a Administração, previamente ao exercício da opção discricionária, exerceu sua competência técnica especializada. Caso assim não se comporte perante o órgão de controle, e não faça prova de que efetivamente se deteve no exame técnico-científico, o ato concreto ou o normativo-regulamentar impugnado deverá ser anulado por falta de motivação, por manifesta infringência ao disposto no art. 50 da Lei 9.784/1999, bem como ao art. 2º, letra “d”, da Lei 4.717/1965, que positivam prescrições relativas ao princípio constitucional do devido processo legal, insculpidos nos incisos LIV e LV do art. 5º da Constituição da República.104

No que pertine especificamente ao exercício da prerrogativa administrativa para a edição de atos normativos de competência do Poder Executivo federal, a demonstração de detalhado exame das prováveis consequências da norma a ser expedida, inclusive sob perspectiva técnica, para além das prescrições legais já referidas, é o exato cumprimento do disposto no Decreto 4.176/2002, que regulamenta a Lei Complementar 95/1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis.

As decisões administrativas tomadas com amparo em discricionariedade técnica buscam sua legitimidade na expertise daquele que toma a decisão. Daí a indispensabilidade de uma fundamentação que revele que a decisão não é caprichosa, mas que é fruto do emprego daquele conhecimento. Em especial no caso de agências reguladoras que foram criadas justamente para prestigiar e fortalecer a tomada de decisões com verniz exclusivamente político. Nesse sentido:

“Todas as escolhas da Administração devem ser justificadas para os administrados. No caso específico das agências, criadas e estruturadas em função de sua especialização, é evidente que suas decisões devem estar embasadas em razões técnicas, ainda aí no espaço que a lei não haja preordenado. Caberá aos especialistas, portanto, demonstrar à sociedade e aos interessados por que consideram que a decisão tomada é a melhor segundo as leis, métodos e os prognósticos de sua técnica.

A competência conferida a cada agência se justifica e se legitima, em grande medida, por sua expertise técnica acerca do funcionamento do setor por ela especificamente regulado. Nessa linha, não se pode minimizar a importância do dever de fundamentação técnico-científica adequadas capazes de demonstrar, racionalmente, as razões que conduziram às decisões tomadas pela agência”.105

O dever de fundamentação mais duro no caso de discricionariedade técnica também se explica pela impossibilidade de tomada de decisão de perfil exclusivamente político. Enfim, as decisões, quando discricionárias, são definições de política de administração, mas não podem ser decisões que retratem opções exclusivamente políticas, aqui entidades em opções políticas em seu sentido ideológico ou sectário.106 Coloca-se a ênfase na junção entre o político e o técnico, não permitindo, porém, a decisão de perfil exclusivamente político, sem negar que parcela do ato tem conteúdo político.107 Daí a indispensabilidade de firmar a discricionariedade técnica como um modelo de exercício da função administrativa, que se caracteriza por deveres especiais de fundamentação em ordem a revelar um controle dos poderes políticos. É o processo e a exigência fundamentação que serviram a essa contenção.

E mais: não bastam as alegações da Administração invocadas na motivação para se concluir que o ato impugnado deverá ser mantido – não se trata de um critério exclusivamente formal. Cumprirá ao juízo examinar detidamente a racionalidade, a razoabilidade e a proporcionalidade da motivação empregada pela autoridade administrativa.108 Será preciso avaliar a pertinência das razões em face dos motivos invocados e a relação destes com as finalidades estabelecidas na lei que outorgou a competência discricionária exercida pela Administração. A atividade de controle jurisdicional poderá, então, valer-se de razões objetivas para fundamentar o decreto de invalidade do ato impugnado. Somente razões que comprovem de forma objetiva o erro da Administração poderão justificar o decreto de nulidade emitido pelo Judiciário sem que se possa arguir violação ao princípio da separação de poderes. Detalhar essas considerações é o objetivo do próximo tópico.

 

4. Controle da discricionariedade técnica

 

Definida, pois, a existência da discricionariedade técnica, definido o sentido da expressão, que marca as diferenças no seu modo de exercício e reclamam a permanência dessa expressão, surge, então, o problema da forma adequada de controle dessa modalidade especial de competência discricionária, especialmente diante dos limites ao controle jurisdicional. Essa questão ganha notável relevo a partir da seguinte observação. Neste estudo, foram apontadas as razões pelas quais a regulação administrativa, em particular da ordem econômica, de certo modo, exige a atribuição de competência discricionária aos órgãos administrativos reguladores. Porém, se a contemporaneidade exige uma Administração mais dinâmica, com maiores prerrogativas discricionários, esse fato não deve servir de mote para uma diminuição dos direitos do administrado com infringência à segurança jurídica.109

Daí a importância do tema ser tratado neste tópico: o controle jurisdicional da discricionariedade técnica. É fundamental, portanto, enfrentar o desafio, ciente das dificuldades inerentes ao tema.110 Afinal, é o controle jurisdicional da atividade administrativa incidente sobre a forma de intelecção dos conceitos indeterminados que será capaz, de um lado, de embargar o uso arbitrário da discricionariedade técnica por parte da Administração Pública. E, de outro lado, serão os limites ao controle jurisdicional que irão preservar as prerrogativas que a lei atribuiu à Administração e irão impedir o casuísmo e a dispersão decisória na tomada de decisões que podem ter impactos regulatórios significativos.

Portanto, se o exercício dessa competência técnica-discricionária de regulação pressupõe, como visto, determinados conhecimentos sobre a ciência, também o controle incidente deverá, de alguma forma, se valer de conhecimentos técnicos. Contudo, esse mesmo conhecimento técnico não deve fazer mera sobreposição de razões de ordem técnica sobre os valores jurídicos. Também não se imagina, quando o saber científico envolvido for polêmico, uma imposição das razões do órgão de controle sobre as razões técnicas da Administração. Do mesmo modo, também não se imagina o inverso: a mera invocação de hipótese de discricionariedade técnica não é garantia de manutenção do ato da Administração.

Fica claro, desse modo, que a formatação desse controle da discricionariedade deve tentar compatibilizar razões técnicas e valores jurídicos. Um critério exclusivamente técnico faria sobreposição dessas razões sobre as escolhas político-valorativas do legislador. Um critério exclusivamente jurídico-valorativo poderia se mostrar empiricamente impraticável ou, até mesmo, contrário às finalidades pretendidas.

Não partilhamos, pois, inteiramente das opiniões doutrinárias que afirmam que “[q]uanto maior a indeterminação de um conceito jurídico (…) tanto mais presente deve ser o controle jurisdicional”.111 Para na sequência afirmar que “[t]oda e qualquer questão técnica e científica, em última análise, é irrestritamente controlável pelo Judiciário”.112 Embora tenhamos por correta a afirmação de quanto maior a indeterminação na previsão legal, maior o dever da Administração de motivação – o que também afirma o autor citado –, não nos parece correto exigir na hipótese maior incidência de controle judicial sem amparo no texto objetivo da lei. Não obstante a tese do controle judicial ampliado e total da atividade administrativa tenha um forte apelo garantista, antenado com os melhores propósitos do Direito Administrativo,113 afirmações no sentido de que o controle jurisdicional deve ser mais incisivo, sem o necessário complemento de que esse controle deve se pautar necessariamente por critérios objetivamente desentranháveis da lei, acabam por fazer uma transferência indevida da discricionariedade da Administração para o Judiciário, que não é órgão funcionalmente, nem juridicamente, competente para realizar opções de políticas públicas. A remissão a conceitos técnicos, muitas vezes, se faz em favor da Administração. Cabe ao Judiciário avaliar se a Administração ateve-se ao limite razoável de equivocidade previsto na lei, mas não lhe compete indicar qual é o significado que subjetivamente entende mais acertado para a hipótese, sob pena de violação do princípio da separação de poderes.114

O controle total da Administração não elimina a discricionariedade, mas a transfere indevidamente para o Judiciário.115 É possível, enfim, listar uma séria de razões pelas quais se deve insistir na competência da Administração para a tomada de decisão, e, assim, não transferi-la ao Judiciário:

“a capacidade técnica e a legitimidade política ou social do órgão administrativo, a qualidade da matéria (direitos fundamentais, interesses complexos), o tipe modo de decisão (juízos sobre aptidões pessoais, decisões com consequências políticas), ‘sendo certo que os tribunais, no contexto de um Estado de Direito equilibrado – o ‘Estado Misto’ actual –, não devem efectuar um controlo total da actividade administrativa, sob pena de cairmos num ‘desequilibrado’ e indesejável ‘Estado dos Juízes’ [José Carlos Vieira de Andrade]’. Fala-se, assim, da existência de uma ‘reserva de Administração’ face ao poder judicial perante o perigo de uma hiper-valorização do papel do juiz no exercício do controlo da função administrativa”.116

Essa limitação ao controle jurisdicional, sob outra ótica, não implica infringência ao princípio constitucional de amplo acesso ao Judiciário, pois a garantia de tutela jurisdicional é possível para a proteção de lesão a direito e ameaça de lesão a direito (Constituição, art. 5º, inciso XXXV). Contudo, em tais hipóteses, o tribunal é incapaz de afirmar, de forma objetiva – ou seja, com fundamento na legalidade –, a existência de lesão ou ameaça a direito. Afinal, a decisão judicial que não se pauta por critérios de legalidade também é arbitrária e inconstitucional.117 Não se deve, pois, exigir da magistratura mais do que ela pode oferecer, imputando ao magistrado a responsabilidade pela última decisão sobre questões técnicas. O controle judicial também tem seus limites, derivados em especial das limitações de cognição.118

O controle judicial, portanto, não foi excluído, em respeito ao princípio de amplo acesso ao Judiciário, mas foi tão longe quanto lhe era possível no controle mediante critérios jurídicos.119 Em verdade, o reconhecimento desse limite ao controle jurisdicional assenta-se no fato de que o entendimento em sentido contrário implica necessariamente a possibilidade de censura à autoridade administrativa competente ainda que o órgão de controle seja incapaz de comprovar de forma objetiva que a decisão adotada é contrária à lei e ao Direito. E não se deve olvidar que a Administração é competente, por força do princípio da legalidade, a realizar a primeira aplicação e compreensão do conceito técnico, cuja intelecção mostra-se nebulosa. Essa aplicação, ainda por força das regras jurídicas referentes ao regime de Direito Público, é, via de regra, dotada de executoriedade e presunção de legitimidade. Portanto, não se deve admitir a desconstituição do ato (seja esse ato concreto ou abstrato) senão em circunstâncias nas quais se possa comprovar de forma objetiva a infringência à lei e ao Direito. Essas razões explicam a deferência120 com a qual o órgão jurisdicional deve abordar a decisão administrativa, desde que, claro, a decisão não se mostre caprichosa, sem fundamentação, desarrazoada ou desproporcional. Deferência essa que é referida em precedente do egrégio Superior Tribunal de Justiça com a qualidade de princípio121 e que ganhou sentido de direito positivo com o novo Código de Processo Civil.122

É mister assentar ainda que o argumento até aqui desenvolvido também não significa admitir o controle do ato expedido no exercício da competência discricionária técnica tão somente nos casos de erro manifesto ou erro grosseiro.123 Não é disso que se trata. O erro, objetivamente detectado pela infringência da ordem jurídica posta, em razão da incapacidade do ato no atendimento à finalidade legal, deve ser afastado pelo órgão de controle. Veja que não se trata aqui de colocar o erro como vício da vontade, mas sim como a falha no emprego da prerrogativa discricionária e que, por isso, não estaria o ato administrativo apto a realizar o interesse público para o qual foi conferida dita competência.124 Assim, por erro manifesto ou grosseiro apenas se pode entender aquele que se apresenta pronto, notório, evidente e, por isso, sequer demandaria prova para que se possa atestar em juízo sua ocorrência (Código de Processo Civil, art. 374, I). O termo manifesto, portanto, seria adjetivo equivalente ao de já revelado, aquilo cuja presença não pode ser negada ou contestada.125 Da mesma forma, há de ser compreendida a expressão erro grosseiro, eis que se trata daquele erro “que não pode ser do desconhecimento do agente”.126 Por isso, não se propõe que o controle seja limitado aos chamados erros manifestos ou grosseiros, mas, sim, que o órgão de controle decrete a nulidade de qualquer erro que seja objetivamente detectado à luz das normas jurídicas postas, ainda que dependente de produção de prova pericial em juízo. Todavia, o órgão de controle não tem competência para afastar o ato em cujo conteúdo não consegue apurar erro algum sob perspectiva jurídica porque não localiza objetivamente a regra de direito violada pelo ato.

Não é demais acrescentar que a conclusão exposta parte do pressuposto de que a Administração possui quadros com qualificação suficiente para o exame da questão técnica, bem como que a aplicação do conceito decorre de uma análise objetiva e imparcial por parte das autoridades administrativas. Importante, nesse sentido, que a Administração já conte com procedimento prévio, orientado aos cânones do devido processo legal, sob pena de exercer mal sua competência discricionária. Enfim, não basta transferir à Administração o encargo de regular situações complexas, mediante previsões legais de parca densidade normativa e que lhes concedem competências discricionárias, mediante remissão no texto normativo a conceitos que, embora oriundos de um ramo científico, são opináveis, eis que não oferecem certeza e segurança.127

Importante, ainda, consignar outra hipótese de limitação ao controle jurisdicional. Referimo-nos neste ponto à possibilidade de aplicar à solução do caso técnicas ou métodos científicos inexistentes à época em que praticado o ato pela autoridade administrativa. Afinal, constituiria desmesurado contrassenso exigir do aplicador da norma que empregasse técnicas ou métodos ainda não cogitados pelas ciências ou supor a possibilidade de controle com amparo em tais parâmetros: é imprescindível que a autoridade leve em consideração o tempo e as circunstâncias sob os quais foi editado o ato submetido a controle.128 Cumpre, contudo, ressalvar a hipótese em que o ato ainda é capaz de produzir efeitos no presente e admite revogação. Em tais circunstâncias, o controle jurisdicional poderá determinar a revogação ou a reavaliação do ato, para ajustá-lo às técnicas presentes, reconhecendo o dever da Administração reapreciar continuamente as posições adotadas na ordenação, desde que tais critérios sejam objetivamente desejados pelo sentido da norma que outorga a competência discricionária à Administração.

É preciso, pois, entender que o parâmetro do controle jurisdicional deve ser objetivamente extraído do ordenamento jurídico, e não revelar uma opção subjetiva do magistrado por uma das vias técnicas legalmente admitidas. Eis a razão pela qual a posição ora defendida não importa em fuga à aplicação do princípio constitucional de amplo acesso ao Judiciário. É que o controle jurisdicional foi tão longe quanto lhe era objetivamente possível. Nessas condições, pensamos que a proposta formulada não incide na crítica de afastar as conquistas seculares do período liberal em nome da complexidade técnica envolvida.129

Dessa forma, temos que, por um lado, ao administrador público cumpre o dever de encontrar os sentidos possíveis da norma a aplicar, de respeitar as regras interpretativas, o contexto em que localizada a norma, situando-a historicamente, bem como apurar se o sentido que pretende atribuir corresponde àquele que é reconhecido pelas técnicas disponíveis para o melhor atendimento do interesse público, na forma do procedimento previsto e no tempo oportuno. E, só a partir desse exercício, apurando mais de um significado possível, deverá exercer sua opção discricionária, segundo sua valoração acerca do significado que melhor atende ao interesse público.

O controle jurisdicional, por outro lado, deve ater-se aos limites objetivos de compreensão do conceito empregado pela norma – pois, os conceitos indeterminados e cláusulas abertas não são palavras “mágicas” com o poder de alterar a realidade fenomênica. Cumprirá certamente ao juiz assegurar que o sentido empregado pela Administração corresponde ao ordinariamente empregado. O órgão de controle deve, pois, definir as zonas adjacentes de vinculação, que circundam e definem o campo próprio do mérito do ato administrativo. Afinal, em particular na dinâmica regulatória, muitas vezes a legislação emprega conceitos ligados à ciência ou ao conhecimento técnico próprio do setor regulado. Ora, conceitos técnico-especializados sobre a matérias tendem (ou pretendem) a conferir maior certeza, razão pela qual não se autoriza a manipulação desses conceitos previstos na legislação de regência, seja pela Administração, seja pelo Judiciário no exercício do controle de legalidade, dos termos, ainda que esses termos sejam de baixa densidade normativa.

Portanto, órgão de execução e órgão de controle devem atentar para os cânones científicos e técnicos, que elucidam o sentido do conceito empregado pela legislação. Não compete, contudo, ao magistrado substituir o significado empregado pela autoridade reguladora ao conceito quando este se revele plausível, coerente, razoável e proporcional na hipótese, mediante a manipulação subjetiva dos conceitos técnicos ou conceitos abertos empregados pela legislação, sob pena de infringência ao princípio constitucional da separação de poderes, consagrado no art. 2º da Constituição da República.

Se assim não for, acaba-se por fazer uma transferência indevida da discricionariedade do órgão regulador para o Judiciário, que não é órgão funcionalmente, nem juridicamente, competente para realizar opções de políticas públicas. A remissão a conceitos técnicos e a cláusulas abertas na legislação, muitas vezes, se faz, sim, em favor da Administração Pública.

Essa compreensão é indispensável para que não passe o Judiciário a interferir indevidamente em políticas públicas.130 É preciso, pois, entender que o parâmetro do controle jurisdicional do ato administrativo deve ser objetivamente extraído do ordenamento jurídico, e não revelar uma opção subjetiva do magistrado por uma das vias legalmente admitidas. Em outros termos, o controle deverá demarcar as zonas de vinculação a que está sujeita a Administração Pública, mas não deve interferir nas opções subjetivas que a lei de habilitação de competência lhe confiou. Daí assegurarmos que a posição ora defendida não importa em fuga à aplicação do princípio constitucional de amplo acesso ao Judiciário. Isso porque o controle jurisdicional foi tão longe quanto lhe era objetivamente possível.

Nesse sentido, nesta parte final, trazemos uma referência ao provocativo estudo da lavra de Carlos Ari Sundfeld, cujo título traz a seguinte indagação “Princípio é preguiça?”. Diz o professor paulista:

“[A] Corte precisa assumir o ônus da legitimação de sua competência, explicando o fundamento específico e, assim, delimitando com clareza seu âmbito de competência normativa. Se não fizer isso, não teremos como saber qual será sua visão nos próximos casos, não teremos como criticar seus critérios, não teremos como controlá-los.

Ao julgarem com base “em princípios”, os juízes exercem função regulatória – e não podem fazê-lo superficialmente. Nosso sistema pode suportar a delegação da tarefa de regular ao Judiciário. Pode até admitir a substituição de regulações legais ou administrativas por outras, criadas pelos juízes. Mas é preciso que estes cumpram os mesmos ônus que têm os reguladores. Elaborar e enunciar com clareza e precisão a regra que, a partir dos princípios, entendem deve ser utilizada para resolver os casos concretos, do mesmo modo que o regulador faz regulamentos, com suas especificações, antes de sair tomando atitudes caso a caso. Estudar com profundidade a realidade em que vão mexer, entender as características e razões da regulação anterior, identificar as alternativas regulatórias existentes, antever os possíveis custos e os impactos, positivos e negativos, em todos os seus aspectos, da nova regulação que se cogita instituir, comparar todas as características da regulação existente e da cogitada. Tudo isto tem de aparecer na motivação da decisão judicial.

Em suma, é preciso que o Judiciário, transformado em regulador, comporte-se como tal, com todos os ônus que isso envolve. Do contrário, teremos decisões [judiciais] puramente arbitrárias”.131

Com efeito, parece não ser coerente a criação de um órgão regulador com expertise no setor regulado, dotado de equipe especializada no conhecimento próprio de Administração do setor regulador; enfim, um órgão devidamente aparatado para o exercício da discricionariedade técnica para, na sequência, admitir a possibilidade um controle assentado em princípios jurídicos de conteúdo rarefeito ou em normas de conteúdo incompleto, em ordem a permitir que a conclusão da Administração Pública será afastada pela mera convicção pessoal – leia-se subjetiva – do magistrado de que a decisão administrativa não atende superiormente ao interesse público. É preciso, portanto, prova contundente e robusta de que a decisão não é tecnicamente apropriada. Assim, se é para anular ou modificar um ato administrativo regulatório que não se mostre ilegal, caprichoso, desproporcional ou desarrazoado, deve-se fazê-lo apenas com a firme convicção de que o ato administrativo em referência – seja ele concreto ou regulamentar – é  infringente ao interesse público, assumindo o órgão de controle os ônus de um verdadeiro regulador e expert na matéria, capaz de revelar empiricamente que o ato é incapaz de atender às finalidades pretendidas pela lei que outorga competência técnica à Administração Pública.

A posição defendida também não despreza o direito do administrado, pois a revisão do ato regulatório pela autoridade judicial, ainda que à mingua de parâmetro jurídico objetivo de controle também representa insegurança para o regulado. Isso porque é preciso que o administrado possa confiar na decisão adotada pela Administração. E a revisão do ato administrativo em todo e qualquer caso, por certo, não favorece essa relação de confiança, mas acaba por provocar uma dispersão da decisão regulatória. Ora, há uma percepção geral de que a reforma ou a anulação de um ato do órgão regulador é fator que gera insegurança jurídica, como já se fez questão de frisar neste estudo. Não se pode permitir que a judicialização se transforme em oportunidade para o ativismo judicial. Daí a necessidade de buscar a composição de uma relação de equilíbrio na compreensão da matéria, que, ao mesmo tempo, prestigie o acesso ao Judiciário, mas tenha deferência com a decisão adotada pela Administração, assegurando que o ato expedido com base em competência discricionária técnica somente será revisto no caso de infringência ao direito posto, e não com fundamento em percepção subjetiva do magistrado de ocasião.

Notas

1 Sobre o conceito de regulação, cf. MARTINS, Ricardo Marcondes. Regulação administrativa à luz da Constituição Federal, passim, e ROMAN, Flavio José. Discricionariedade técnica na regulação econômica, p. 135 e ss., no qual contestamos, com o devido acatamento, a respeitável posição de Ricardo M. Martins.

2 Já tivemos a oportunidade de afirmar que as agências reguladoras são mecanismos institucionais que não estão mais historicamente localizados, inclusive no Brasil. Embora concebidas pelo neoliberalismo, as agências transformaram-se no último front de defesa do interesse público. Eis a razão pela qual já não se pode prescindir dessas agências para a defesa dos consumidores, para a preservação da higidez do mercado, bem como da concorrência nos setores regulados, enfim, para direcionar e equilibrar as atividades para que seja atendido o interesse público. As agências reguladoras, efetivamente, são, além de necessárias, úteis, apesar dos conflitos que surgem em torno de suas decisões, dos riscos de captura e da dificuldade relacionada ao seu enquadramento constitucional. Sobre essas concepções, vide, entre outros, FERREIRA, Eduardo Paz. A regulação pública de actividades económicas em Portugal. Direito comparado: perspectivas luso-americanas = Comparative law: portuguese-american perspectives, p. 14; ELLIOTT, Heather. Public regulation in the United States: an overview. Direito comparado: perspectivas luso-americanas = Comparative law: portuguese-american perspectives, p. 28; ROMAN, Flavio José. Discricionariedade técnica na regulação econômica, pp. 149-151; SANT’ANA, Diogo de. Conjuntura da regulação no Brasil. Direito econômico regulatório, p. 375; e ACKERMAN, Bruce. The new separation of powers. Harvard law reveiw, v. 113, p. 689.

3 “O controle judicial das agências reguladoras reavivou os debates em torno da discricionariedade técnica”. WANG, Daniel Wei Liang; PALMA, Juliana Bonacorsi; COLOMBO, Daniel Gama e. Revisão judicial dos atos das agências reguladoras: uma análise da jurisprudência brasileira. Direito econômico regulatório, p. 281. “A discricionariedade técnica passou a despertar maior interesse com a criação das agências reguladoras no sistema jurídico brasileiro”. GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. A teoria dos conceitos indeterminados e a discricionariedade técnica. Cadernos de direito constitucional e ciência política, nº 12, p. 182.

4 CORDEIRO, André Felipe de Barros. Teoria dos conceitos jurídicos “indeterminados” aplicada ao direito administrativo, p. 41.

5 SOUSA, António Francisco de. Os “conceitos legais indeterminados” no direito administrativo alemão, pp. 278 e ss., e CORDEIRO, André Felipe de Barros. Teoria dos conceitos jurídicos “indeterminados” aplicada ao direito administrativo, p. 45. Cf., ainda, BULLINGER, Martin. A discricionariedade da Administração Pública, pp. 05-06, especialmente nota 13.

6 QUEIRÓ, Afonso Rodrigues. A teoria do “desvio de poder’ em direito administrativo [2ª parte], pp. 54-55.

7 CORDEIRO, André Felipe de Barros. Teoria dos conceitos jurídicos “indeterminados” aplicada ao direito administrativo, p. 49.

8 BERNATZIK Edmund apud SILVA, Almiro do Couto e. Correção de prova de concurso público e controle jurisdicional. Direito público: estudos em homenagem ao Professor Adilson Abreu Dallari, p. 19.

9 Cf. QUEIRÓ, Afonso Rodrigues. A teoria do “desvio de poder” em direito administrativo [1ª parte], p. 72; BULLINGER, Martin. A discricionariedade da Administração Pública. Revista de ciência política, pp. 05-06, especialmente nota 15, CORDEIRO, André Felipe de Barros. Teoria dos conceitos jurídicos “indeterminados” aplicada ao direito administrativo, pp. 49-52. Aldo Piras esclarece que o confronto às ideias de Bernatzik não virá apenas da pena de Tezner, como pontuado, mas também de outros autores como Rudolf von Laun e Walter Jellinek, dominando, assim, o debate em língua germânica. PIRAS, Aldo. Discrezionalità amministrativa, p. 71, 1ª col.

10 SOUSA, António Francisco de Sousa. Os “conceitos legais indeterminados” no direito administrativo alemão, p. 279. Em texto mais recente, é Cássio Cavalli quem afirmará que o centenário conflito entre as correntes doutrinárias encabeçadas por Bernatzik e Tezner “ecoam até os dias atuais.” O controle da discricionariedade administrativa e a discricionariedade técnica. Revista de direito administrativo, v. 251, p. 67. Segundo André Felipe de Barros Cordeiro, a distinção entre teoria da duplicidade e teoria da unicidade é uma redução que pode gerar incompreensão, pois os dois autores admitem mais de uma resposta diante do caso concreto. Em verdade, a distinção estaria mais ligada à intensidade e forma de controle. CORDEIRO, André Felipe de Barros. Teoria dos conceitos jurídicos “indeterminados” aplicada ao direito administrativo, p. 56. Parece-nos, contudo, que a distinção entre unicidade e duplicidade ainda persiste, pois, por um lado, a tese da unicidade afirma a possibilidade de o órgão de controle dizer, segundo cânones jurídicos, a única resposta possível, por outro lado, a tese da duplicidade, assevera a impossibilidade de se dizer a única resposta certa segundo padrões jurídicos e, por isso, preservaria o ato praticado pela Administração. Porém, estamos com André F. de B. Cordeiro quando afirma que não é mero capricho acadêmico o estudo das obras de produzidas em outro contexto histórico e sob a influência de direito positivo alheio ao nosso. É que “a teoria dos conceitos jurídicos prescinde do estudo de um ordenamento concreto. O tema dos conceitos jurídicos antecede à discricionariedade. Gravita ao redor da linguística, da semiótica e da filosofia, com pontos de contatos na lógica e na teoria dos conjuntos (…) Não se olvida que a particularidade de cada sistema deve ser considerada, mormente quanto ao órgão competente, à forma específica de controle e aos seus limites. Porém, isso não obsta o traçado de linhas gerais de uma teoria dos conceitos jurídicos, apta a analisar a interpretação e aplicação do Direito, tanto por um enfoque lógico, como linguístico e filosófico.” CORDEIRO, André Felipe de Barros. Teoria dos conceitos jurídicos “indeterminados” aplicada ao direito administrativo, pp. 38-39. Sobre as ideias de Bernatzik e Tezner, vide também KRELL, Andreas J. A recepção das teorias alemãs sobre “conceitos jurídicos indeterminados” e o controle da discricionariedade no Brasil. Interesse público, v. 5, nº 23, pp. 05-06.

11 GARCÍA DE ENTERRIA, Eduardo; FERNÁNDES, Tomás-Ramón Fernández. Curso de derecho administrativo, p. 465. No mesmo sentido, entre nós, a lição de Eros Grau: “Os conceitos indeterminados – que compreendem conceitos de experiência ou de valor – não conduzem a uma situação de indeterminação na sua aplicação. A aplicação deles, segundo García de Enterría, só permite uma ‘unidade de solução’ em cada caso (1983/434). Assim, quando se fala, em boa-fé, v.g., o conceito se dá ou não se dá. Em outros termos, em presença de um caso determinado há ou não há boa-fé: tertium non datur.” GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto, p. 203.

12 Fernanda Paula Oliveira registra as três correntes possíveis sobre o tema: (i) a que localiza a discricionariedade apenas no consequente da norma; (ii) a que considera que a discricionariedade pode estar localizada na consequência e nos pressupostos de fato da atuação; e (iii) finalmente, a que estabelece que a discricionariedade se localiza apenas no âmbito do pressuposto de fato imperfeito da norma. OLIVEIRA, Fernanda Paula. A discricionariedade de planeamento urbanístico municipal na dogmática geral da discricionariedade administrativa, pp. 43-60. Neste estudo, consideramos que a discricionariedade pode estar presente em qualquer dos elementos da norma administrativa completa, com exceção da competência subjetiva. Retornaremos ao tópica mais à frente.

13 Sobre a complexidade da norma administrativa completa, cf. ROMAN, Flavio José.  Discricionariedade técnica na regulação econômica, pp. 33-35 e CIRIANO VELA, César David. Administración económica y discrecionalidad (un análisis normativo y jurisprudencial), pp. 60-76 e 159-191.

14 SOUSA, António Francisco de Sousa. Os “conceitos legais indeterminados” no direito administrativo alemão, p. 283.

15 KRELL, Andreas J. A recepção das teorias alemãs sobre “conceitos jurídicos indeterminados” e o controle da discricionariedade no Brasil. Interesse público, v. 5, nº 23, p. 09.

16 “[S]obre o fato em si não é possível a Administração ‘escolher’ que não existe, apesar de existir, que não há previsão normativa para aquela situação, apesar de haver. O fato, em suma, relaciona-se com o mundo dos fenômenos físicos e o direito não pode alterar as leis naturais.” PIRES, Luis Manuel Fonseca. Controle judicial da discricionariedade administrativa, p. 197. Considerações nesse mesmo sentido, são encontradas em GARCÍA DE ENTERRIA, Eduardo; FERNÁNDES, Tomás-Ramón Fernández. Curso de derecho administrativo, pp. 481 e 482.

17 Apud GUERRA, Sérgio. Discricionariedade técnica e agências reguladoras, p. 881. A mesma referência também é encontrada em CIRIANO VELA, César David. Administración económica y discrecionalidad (un análisis normativo y jurisprudencial), pp. 128-129.

18 CIRIANO VELA, César David. Administración económica y discrecionalidad (un análisis normativo y jurisprudencial), p. 445.

19 GUERRA, Sérgio. Discricionariedade técnica e agências reguladoras: uma abordagem em sede doutrinária e pretoriana. Direito administrativo: estudos em homenagem a Diogo de Figueiredo Moreira Neto, p. 884.

20 Sobre o conceito de margem ou área de apreciação, cf. WOLFF, Hans Julius; BACHOF, Otto; STOBER, Rolf. Direito administrativo, p. 452 e ss.

21 MAURER, Hartmut. Direito administrativo geral, p. 143. Não obstante essa consideração, o autor ainda propugna que seja mantida a distinção entre conceito indeterminado e a concessão de poder discricionário. Cf., ainda, a doutrina de Eckart Hien, que também propõe sejam diferenciadas as hipóteses de discricionariedade e de controle dos conceitos indeterminados; porém, não deixa de reconhecer que, “[e]xistindo liberdade de apreciação, a intensidade do controle judicial fica restrita de forma semelhante ao caso de decisões discricionárias em sentido estrito.” HIEN, Eckart. O controle judicial das decisões administrativas discricionárias, p. 23, 2ª col.

22 OLIVEIRA, Fernanda Paula. A discricionariedade de planeamento urbanístico municipal na dogmática geral da discricionariedade administrativa, p. 54. A autora referida, mais à frente na mesma obra, afiança que a doutrina e a jurisprudência mais recente ao introduzir as ideias de margem de liberdade, margem de apreciação e prerrogativas de avaliação pretendem referir-se a um grau menor de discricionariedade, que seria mais limitado que a clássica discricionariedade, mas que, no fundo, submetem-se ao mesmo regime jurídico. É possível, por isso, cada vez mais encontrar quem conteste a diferença entre conceitos indeterminados e discricionariedade. A referida autora propõe, dessa forma, uma visão unitária da discricionariedade. Esse alargamento da noção de discricionariedade não implica, contudo, maior afastamento ou desvinculação do direito pela Administração, eis que as normas jurídicas regulam não apenas a decisão a ser adotada pela Administração, mas também o processo de formação dessa decisão. Idem, pp. 64-66.

23 CIRIANO VELA, César David. Administración económica y discrecionalidad (un análisis normativo y jurisprudencial), p. 131. De forma idêntica, Andreas J. Krell assegura que a “diferença na densidade da vinculação do Executivo é, portanto, apenas quantitativa, não qualitativa.” KRELL, Andreas J. A recepção das teorias alemãs sobre “conceitos jurídicos indeterminados” e o controle da discricionariedade no Brasil. Interesse público, v. 5, nº 23, p. 16.

24 KRELL, Andreas J. Op. cit., p. 9.

25 Nesse sentido, cf. PEREIRA, Cesar A. Guimarães. Discricionariedade e apreciações técnicas da administração. Revista de direito administrativo, v. 231, p. 235.

26 “O poder discricionário aparece, assim, como necessário elemento na gradual formação do direito ou das normas jurídicas; é ele que as torna sucessivamente mais concretas”. QUEIRÓ, Afonso Rodrigues. A teoria do “desvio de poder” em direito administrativo [1ª parte], p. 44. Mais recentemente: “Na verdade, é possível afirmar, sem receio de errar, que não há falar em administração pública sem considerar a discricionariedade. (…) é fora de propósito defender seu descarte.” CARVALHO FILHO, José dos Santos. Discricionariedade técnica e controle judicial. Revista de direito da Administração Pública, v. 1, nº 1, p. 225. Cf., ainda, NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. Há uma discricionariedade técnica? Revista do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal da Bahia, nº 28, p. 114.

27 KRELL, Andreas J. A recepção das teorias alemãs sobre “conceitos jurídicos indeterminados” e o controle da discricionariedade no Brasil. Interesse público, v. 5, nº 23, pp. 06-07.

28 FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Direito, linguagem e interpretação. Direito e interpretação: racionalidade e instituições, p. 108.

29 Idem, pp. 108-113.

30 FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Direito, linguagem e interpretação. Direito e interpretação: racionalidade e instituições, p. 117.

31 Idem, p. 111.

32 Noel Struchiner explica que “mesmo conceitos morais altamente controvertidos, costumam ter um núcleo duro de significado, casos diante dos quais ninguém tem dúvida de que o conceito claramente se aplica ou não se aplica.” STRUCHINER, Noel. Indeterminação e objetividade. Quando o direito diz o que não queremos ouvir. Direito e interpretação: racionalidades e instituições,  p. 137, nota 34. Sobre a questão, assim se pronuncia Celso Antônio Bandeira de Mello quando aprecia a compreensão do termo “urgência”: “Acreditar que, em casos desta ordem, o agente está livre graças à invocação destas expressões semi-indefinidadas corresponde a atribuir-lhes uma significação ‘mágica’. Equivale a conferir-lhes aquele condão de transformar as coisas.” BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Controle judicial dos limites da discricionariedade administrativa, p. 36. Em outro estudo sobre a discricionariedade, Celso Antônio Bandeira de Mello esclarece que a discricionariedade é sempre relativa, “no sentido de que liberdade acarretada pela circunstância de haver a lei se servido de expressões vagas, fluidas ou imprecisas não pode ser utilizada de maneira a desprender-se do campo significativo mínimo que tais palavras recobrem, isto é, das chamadas ‘zonas de certeza positiva’ e ‘certeza negativa’, nem do significado social imanente nas palavras legais das quais resultou tal liberdade. (…) o agente público (…) não está autorizado a fazer delas uma intelecção desarrazoada, arbitrária, distante do senso comum, liberta do sentido corrente que necessariamente lhes terá de ser reconhecido em dado tempo e lugar.” BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. “Relatividade” da competência discricionária. Revista de direito administrativo, v. 212, p. 51.

33 LEAL, Victor Nunes. Poder discricionário e ação arbitrária da administração, p. 65.

34 BERNATZIK Edmund apud QUEIRÓ, Afonso Rodrigues. A teoria do “desvio de poder” em direito administrativo [1ª parte], p. 63.

35 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Existe um novo direito administrativo? Supremacia do interesse público e outros temas relevantes do direito administrativo, p. 5, os destaques são do original.

36 HAURIOU, André. O poder discricionário e sua justificação, pp. 27-28, nota 3. No mesmo sentido, Fernanda Paula Oliveira, ancorando-se em lição de José Carlos Vieira de Andrade, lembra que a atividade de controle (fiscalização) se distingue funcionalmente da atividade decisória (de autoria), eis que a atividade de controle deve se limitar a criação de um paradigma normativo abstrato de controle, enquanto que a atividade decisória é mais exigente e completa, determinando uma ineliminável responsabilidade daquele que decide. Bem por isso, coerentemente, conclui que não se deve “admitir um controlo que autorize [o juiz] a gerar regras jurídicas (nem que seja apenas para o caso concreto), só tendo o poder para as interpretar e aplicar.” OLIVEIRA, Fernanda Paula de. A discricionariedade de planeamento urbanístico municipal na dogmática geral da discricionariedade administrativa, pp. 99 e 107.

37 STRUCHINER, Noel. Indeterminação e objetividade. Quando o direito diz o que não queremos ouvir. Direito e interpretação: racionalidades e instituições, p. 130.

38 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Da constitucionalização do direito administrativo: reflexos sobre o princípio da legalidade e a discricionariedade administrativa. Supremacia do interesse público e outros temas relevantes do direito administrativo, pp. 186-187. Em texto no qual aprecia a questão do poder regulamentar da Anvisa sobre a propaganda, também Tércio Sampaio Ferraz Júnior acaba por concluir pela possibilidade de juízos discricionários em razão dos conceitos indeterminados previstos em lei. “Simplesmente o uso de conceitos indeterminados pelo legislador confere uma margem de discricionariedade à agência na interpretação, aplicação e regulamentação complementar das leis às quais a agência se submete”. FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Competência da Anvisa e a regulamentação da propaganda. Revista de direito administrativo, v. 251, p. 222.

39 STOBER, Rolf. Direito administrativo económico geral, p. 309, os destaques são do original.

40 Nesse sentido, cf. CIRIANO VELA, César David. Administración económica y discrecionalidad (un análisis normativo y jurisprudencial), pp. 444-446. Sobre a relação entre discricionariedade e conceitos indeterminados, a bibliografia é extensa, além dos autores citados neste estudo, cf., entre outros, QUEIRÓ, Afonso R. Os limites do poder discricionário das autoridades administrativas e CARRIÓ, Genaro R. Notas sobre derecho y lenguaje, pp. 66-69.

41 OLIVEIRA, Fernanda Paula de. A discricionariedade de planeamento urbanístico municipal na dogmática geral da discricionariedade administrativa, p. 70. No trecho, a autora refere-se especificamente aos casos de discricionariedade imprópria, dentre os quais se localiza o caso da discricionariedade técnica.

42 Cf. SILVA, Almiro do Couto e. Correção de prova de concurso público e controle jurisdicional. Direito público: estudos em homenagem ao Professor Adilson Abreu Dallari, p. 274.

43 O professor Oswaldo Aranha Bandeira de Mello cogita os seguintes exemplos de discricionariedade técnica: “São os casos de conservação de obras, que desrespeitam as posturas ou leis de polícia de construção, quanto à segurança e higiene, mas a Administração Pública admite que sejam toleradas, se tiverem um mínimo de suficiência, em realizadas tais ou quais providências de adaptação.” Já o exemplo de acertamento técnico, é assim descrito: “Assim, à verificação se devem ser abatidos certos animais ou erradicadas determinadas plantações por se acharem atacadas de moléstias contagiosas, prejudiciais à pecuária ou à agricultura. Só em ocorrendo laudo técnico nesse sentido, deve ser determinado pelos órgãos administrativos o abatimento dos animais e a erradicação das plantações.” BANDEIRA DE MELLO, Oswaldo Aranha. Princípios gerais de direito administrativo, p. 476.

44 Cf. PIRES, Luis Manuel Fonseca. Controle judicial da discricionariedade administrativa: dos conceitos jurídicos indeterminados às políticas públicas, p. 226.

45 Para o referido autor italiano a discricionariedade está, como dito, relacionada à indeterminação da indicação pelo ordenamento do interesse público, que poderá decorrer de quatro causas diferentes: (a) a indicação é dependente de uma condição de fato suscetível de acertamento; (b) é dependente de uma condição suscetível de existir em grau maior ou grau menor; (c) consiste na simples estipulação de uma forma particular de interesse público (interesse cultural, interesse econômico etc.); e (d) faz-se apenas uma referência implícita ao interesse público. Assim, o poder discricionário da Administração varia segundo as referidas causas, sendo menor na primeira hipótese e maior na última hipótese. ALESSI, Renato. Sistema istituzionale del diritto amministrativo italiano, pp. 201-204.

46 Cf. GUERRA, Sérgio. Discricionariedade técnica e agências reguladoras, pp. 891-892. Sobre a doutrina de Renato Alessi, cf., ainda, GORDILLO, Agustín. Tratado de derecho administrativo, pp. X-15 e X-16; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade técnica e agências reguladoras. Estudos de direito público em homenagem a Celso Antônio Bandeira de Mello, pp. 486-487, e DAROCA, Eva Desdentado. Los problemas del control judicial de la discrecionalidad técnica, p. 37, nota 34.

47 Cf. DAROCA, Eva Desdentado. Los problemas del control judicial de la discrecionalidad técnica: un estudio crítico de la jurisprudencia, pp. 35-37.

48 Cf. NARDI, Luciana Sant’ana. Discricionariedade administrativa e “discricionariedade técnica”, p. 53, e GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. A teoria dos conceitos indeterminados e a discricionariedade técnica. Revista de direito constitucional e internacional, v. 46, p. 174.

49 Cf. DAROCA, Eva Desdentado. Op. cit., pp. 48-50.

50 Cf. DAROCA, Eva Desdentado. Los problemas del control judicial de la discrecionalidad técnica: un estudio crítico de la jurisprudencia, pp. 52-56; e NARDI, Luciana Sant’ana. Discricionariedade administrativa e “discricionariedade técnica”, pp. 58-59. As colocações de Marzuoli se aproximam das de Paolo Lazzara, que será referenciado mais à frente, que também atesta a necessidade de apurar se a lei quis efetivamente atribuir naquele contexto legal competência discricionária à Administração.

51 CORDEIRO, André Felipe de Barros. Teoria dos conceitos jurídicos “indeterminados” aplicada ao direito administrativo, p. 112-114

52 DAROCA, Eva Desdentado. Los problemas del control judicial de la discrecionalidad técnica: un estudio crítico de la jurisprudencia, pp. 62-67 e 87-97.

53 DAROCA, Eva Desdentado. Los problemas del control judicial de la discrecionalidad técnica: un estudio crítico de la jurisprudência, pp. 116-141.

54 DAROCA, Eva Desdentado. Los problemas del control judicial de la discrecionalidad técnica: un estudio crítico de la jurisprudência, pp. 142-152. Cf., ainda, PIRES, Luis Manuel Fonseca. Controle judicial da discricionariedade administrativa: dos conceitos jurídicos indeterminados às políticas públicas, pp. 224-228; NARDI, Luciana Sant’ana. Discricionariedade administrativa e “discricionariedade técnica”, pp. 64-66; e NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. Há uma discricionariedade técnica? Revista do programa de pós-graduação em direito da Universidade Federal da Bahia, pp. 123-125, trechos nos quais sintetizam a obra de Eva Desdentado Daroca.

55 PIRES, Luis Manuel Fonseca. Controle judicial da discricionariedade administrativa, pp. 223-241 e 330.

56 Idem, pp. 232-235. Essa forma de compreensão tem diversos adeptos. Nesse sentido: “A tese da discricionariedade técnica é, como se vê, insustentável. GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto, p. 215. A conclusão será reafirmada em GRAU, Eros Roberto. Discricionariedade técnica e parecer técnico [parecer], pp. 114-116. Veja-se, ainda, a afirmação de CARVALHO FILHO, José dos Santos. Discricionariedade técnica e controle judicial. Revista de direito da Administração Pública, v. 1, nº 1, p. 230, trecho no qual assenta a “avaliação de juízos técnicos, diferentemente do que ocorre com o juízo político, sempre admite revisão”. Embora não deixe de reconhecer que “na chamada discricionariedade técnica surgem algumas dificuldades para o exercício do controle judicial”. Idem, p. 233. Ainda no mesmo sentido, Nobre Júnior afiança “que sempre que a regra de direito se reporta à guisa de motivo autorizador da edição de um ato administrativo, a uma situação cuja caracterização envolva conhecimento técnicos, tem-se o exercício de uma competência vinculada e não discricionária.” NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. Há uma discricionariedade técnica? Revista do programa de pós-graduação em direito da Universidade Federal da Bahia, nº 28, v. 25, p. 128. Enfim, “a chamada discricionariedade técnica de discricionariedade não tem nada: é pura vinculação”. CINTRA DO AMARAL, Antônio Carlos. O conceito de discricionariedade técnica. Comentários, comentário nº 159, p. 01.

57 SUNDFELD, Carlos Ari; CÂMARA, Jacintho Arruda. Controle judicial dos atos administrativos, p. 13.

58 SILVA, Almiro do Couto e. Correção de prova de concurso público. Direito público: estudos em homenagem ao Professor Adilson Abreu Dallari, pp. 13-17 e 27.

59 PEREIRA, Cesar A. Guimarães. Discricionariedade e apreciações técnicas. Revista de direito administrativo, v. 231, pp. 240-241 e 254-260.

60 PEREIRA, Cesar A. Guimarães. Discricionariedade e apreciações técnicas. Revista de direito administrativo, v. 231, pp. 261-262, o grifo não é do original. O entendimento de Cesar A. Guimarães Pereira é acolhido por SCHWIND, Rafael Wallbach. Poder normativo das agências reguladoras, apreciações técnicas e controle jurisdicional. Revista de direito público da economia, nº 8, pp. 05-06.

61 PEREIRA, Cesar A. Guimarães. Op. cit., p. 265. No mesmo sentido: “A nosso ver, diante da confusão gerada pela equivocidade da expressão ‘discricionariedade técnica’, da falta de especificidade do seu objeto, bem como da inexistência de regime jurídico próprio, o termo deveria ser abandonado.” GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. A teoria dos conceitos indeterminados e a discricionariedade técnica. Cadernos de direito constitucional e ciência política, nº 12, p. 181.

62 GUERRA, Sérgio. Discricionariedade técnica e agências reguladoras, pp. 899-901. A conclusão do autor é reafirmada em GUERRA, Sérgio. Poder normativo das agências reguladoras. Revista de direito administrativo, v. 252, pp. 158-159.

63 Sobre a compreensão de autonomia administrativa, cf. CAETANO, Marcello. Princípios fundamentais do direito administrativo, p. 70; e GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. As agências reguladoras. Revista de direito constitucional e internacional, v. 46, p. 82, nota 13.

64 Cf. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade técnica e discricionariedade administrativa. Estudos de direito público em homenagem a Celso Antônio Bandeira de Mello, p. 484.

65 FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Como regular agências reguladoras? Revista brasileira de direito público, nº 22, p. 02.

66 “[C]onclui-se que a discricionariedade técnica é fator determinante para atribuição de função normativa às agências reguladoras, na medida em que as matérias que podem ser objeto de delegação são restritas a pontos que, pela sua própria tecnicidade, não são normatizados satisfatoriamente pelo Congresso Nacional, encarregado de traçar os conceitos gerais e as políticas setoriais.” ROCHA, Jaqueline Mainel. Discricionariedade técnica e poder normativo das agências reguladoras brasileiras. Limites jurídicos da regulação e defesa da concorrência, p. 211.

67 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Regulação da economia: conceito e características contemporâneas. Curso de direito administrativo econômico, v. III, p. 439.

68 ELLIOTT, Heather. Public regulation in the United States: an overview. Direito comparado: perspectivas luso-americanas = Comparative law: portuguese-american perspectives, pp. 28-29. Em nossa tradução: “Então, afirma-se, o Congresso tem uma pequena esperança de resolver problemas urgentes, mas uma bem menor de compreender os detalhes técnicos necessários para a regular as atividades do dia-a-dia de uma economia moderna. As agências, então, resolvem esses problemas.”

69 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade técnica e discricionariedade administrativa. Estudos de direito público em homenagem a Celso Antônio Bandeira de Mello, pp. 489-494.

70 Sobre a noção de standard, cf. BANDEIRA DE MELLO, Oswaldo Aranha. Princípios gerais de direito administrativo, p. 413.

71 OSÓRIO, Fábio Medina. OSÓRIO, Fábio Medina. Os limites da discricionariedade técnica e as provas objetivas nos concursos públicos de ingresso nas carreiras jurídicas. Fundamentos do Estado de direito: estudos em homenagem ao professor Almiro do Couto e Silva, pp. 245, nota 9.

72 “Volta hoje a pôr-se em destaque o papel insubstituível dos tribunais no seu incessante e criativo diálogo com o legislador como arautos do ‘common law’ e, nesta medida, de um sentido mais crítico e profundo da legalidade, perdida que já ficou a fé nas virtudes da produção normativa feita por entidades administrativas especializadas, as já referidas ‘agencies’ e por outras entidades independentes.” MONCADA, Luís S. Cabral de. Lei e regulamento, p. 633.

73 Idem, pp. 635-636 e 649-651.

74 FIGUEIREDO, Marcelo. As agências reguladoras, pp. 300-301.

75 Parece-nos, pois, no mínimo, incompleta a afirmação de alguns autores no sentido de que, quanto aos conceitos técnicos estampados em lei, a apreciação jurisdicional é completa e, portanto, não existe discricionariedade em sentido próprio. Nesse sentido: “O mesmo não ocorre com a discricionariedade técnica, onde não existe propriamente discricionariedade, uma vez que o conceito indeterminado da norma é de ordem técnica e vai ser definido com base em critérios técnicos extraídos da ciência. Neste caso não há qualquer dificuldade para o Poder Judiciário rever a decisão da Administração Pública, podendo se valer do auxílio de peritos”. TORRES, Edgard Marcelo Rocha. O controle dos atos administrativos pelos tribunais diante da nova dimensão dos conceitos de discricionariedade técnica e discricionariedade administrativa. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, v. 76, nº 3, p. 07.

76 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e controle jurisdicional, pp. 25-26.

77 Nesse sentido, cf. GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. Conceitos indeterminados e discricionariedade administrativa. Revista de direito constitucional e internacional, v. 46, pp. 100-103; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade técnica e discricionariedade administrativa. Estudos de direito público em homenagem a Celso Antônio Bandeira de Mello, pp. 497-499, e ROCHA, Jaqueline Mainel. Discricionariedade técnica e poder normativo das agências reguladoras brasileiras. Limites jurídicos da regulação e defesa da concorrência, p. 166.

78 Cf. CIRIANO VELA, César David. Administración económica y discrecionalidad (un análisis normativo y jurisprudencial), pp. 195-205. O autor assegura que esse recurso a conceitos indeterminados é uma imposição da complexidade da realidade que se quer disciplinar. Daí que é possível reduzir, mas não é possível eliminar a discricionariedade técnica.

79 GORDILLO, Agustín. Tratado de derecho administrativo, pp. X-15 e X-16.

80 BANDEIRA DE MELLO, Oswaldo Aranha. Princípios gerais de direito administrativo, p. 475. Convém anotar, ainda, a importância da lição de Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, que foi recentemente retomada por Celso Antônio Bandeira de Mello na 28ª edição de seu Curso, com a finalidade de esclarecer o “nebuloso conceito” de discricionariedade técnica. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo, pp. 7, 437-438.

81 “A princípio, os termos discricionariedade e técnica soam inconciliáveis. Discricionariedade remete à margem de escolha entre indiferentes jurídicos conferida legalmente ao administrador, a fim de que possa adotar a melhor solução diante do caso concreto. Já o termo técnica se relaciona a meio de análise preciso de uma situação e determinação de uma solução, estabelecendo-se, em face de certa ciência, a opção dita correta para o caso concreto. Entretanto, a noção de discricionariedade técnica, contrariando esta avaliação inicial, admite a conjunção das duas noções, produzindo uma síntese final que admite a combinação das duas, sem desnaturação de seu sentido original. Pode-se afirmar, na realidade, que a conjugação de discricionariedade e técnica é a amalgama de conceitos antitéticos, visto que o termo técnica remete a regras objetivamente válidas, a que a Administração há de se submeter, enquanto o termo discricionariedade expressa suas margens de escolha. (…) Importa frisar que a discricionariedade técnica combina apreciação de mérito administrativo com critérios técnicos, surgindo, justamente, da apreciação de conveniência e oportunidade que se tece sobre base técnica. Conclui-se, pois, que a junção dos dois termos não é um paradoxo.” ROCHA, Jaqueline Mainel. Discricionariedade técnica e poder normativo das agências reguladoras brasileiras. Limites jurídicos da regulação e defesa da concorrência, pp. 163 e 210.

82 No sentido proposto: “embora a técnica delimite as alternativas, a escolha entre elas envolverá um juízo de conveniência e de oportunidade, sempre orientados pelo interesse público. Daí por que haverá situações em que será difícil distinguir a discricionariedade da discricionariedade técnica, notadamente porque a ciência não assegurará ‘certeza das decisões a adotar’. Nesse caso, não haverá certeza, mas probabilidades. Assim, embora a técnica não seja, no mais das vezes, suficiente para determinar a adoção desta ou daquela solução administrativa, ‘a escolha concreta deverá vincular-se a juízos técnico-científicos.’” CAVALLI, Cássio. O controle da discricionariedade administrativa e a discricionariedade técnica. Revista de direito administrativo, v. 251, pp. 74-75.

83 Apud GUERRA, Sérgio. Discricionariedade técnica e agências reguladoras, p. 893.

84 CIRIANO VELA, César David. Administración económica y discrecionalidad (un análisis normativo y jurisprudencial), p. 42.

85 Cf. OLIVEIRA, Fernanda Paula. A discricionariedade de planeamento urbanístico municipal na dogmática geral da discricionariedade administrativa, p. 90 a 94. Nada obstante o argumento desenvolvido, deve-se ter cautela com a matéria, eis que não se permite o esvaziamento do conteúdo essencial da lei. Enfim, há padrões mínimos, decorrentes das exigências da legalidade. Sobre as exigências da legalidade, cf. ROMAN, Flavio José. Os regulamentos e as exigências da legalidade: estudo sobre a viabilidade dos regulamentos delegados no ordenamento jurídico brasileiro, p. 180 e ss.

86 GUERRA, Sérgio. Poder normativo das agências reguladoras, pp. 147-161.

87 MONCADA, Luís Solano Cabral de. Lei e regulamento, p. 16.

88 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Regulação da economia: conceito e características contemporâneas. Curso de direito administrativo econômico, v. III, pp. 434-446. Ainda sobre a perspectiva exposta, a lição de DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Da constitucionalização do direito administrativo: reflexos sobre o princípio da legalidade e a discricionariedade administrativa. Supremacia do interesse público e outros temas relevantes do direito administrativo, p. 199, trecho no qual trata da minimização da lei que é, todavia, contrabalanceado pela maior extensão do controle judicial.

89 “Especialmente, no direito administrativo económico, o legislador não pode prescindir do recurso a cláusulas gerais e a conceitos jurídicos indeterminados, sem tipificações ou generalizações (ver infra § 33º, II). O Legislador tem de se servir de formulações abstratas e indeterminadas, se pretende colocar as autoridades administrativas em situação de poder tomar em devida consideração as especiais circunstâncias do caso concreto, as situações em rápida mudança e responder adequadamente às necessidades de ordenações das manifestações de massa”. STOBER, Rolf. Direito administrativo económico geral: fundamentos e princípios, direito constitucional económico, p. 73, os destaques são do original. Sobre a questão, cf. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Regulação da economia: conceito e características contemporâneas. Curso de direito administrativo econômico, v. III, p. 447, texto no qual afirma que é necessário manter a inevitável instabilidade da economia dentro de um nível razoável.

90 “Ademais, se a necessidade de conferir previsibilidade e segurança jurídica na regulação foi um dos fatores determinantes da criação de agências reguladoras dotadas de autonomia e independência, natural que essa mesma ordem de preocupações se manifeste no controle judicial dos atos regulatórios. Recorrentes revisões judiciais da regulação, especialmente no caso de caráter técnico, podem obstaculizar a realização de investimentos privados de longo prazo nos setores, por diminuir a previsibilidade e a segurança do mercado regulado”. WANG, Daniel Wei Liang; PALMA, Juliana Bonacorsi; COLOMBO, Daniel Gama e. Revisão judicial dos atos das agências reguladoras: uma análise da jurisprudência brasileira. Direito econômico regulatório, p. 275. O argumento, é verdade, revela certo contrassenso na forma como é colocado. É que se esquece que é o controle jurisdicional que evita o uso arbitrário das prerrogativas pela Administração. Ademais, ignora-se, por completo, a tese da captura do órgão regulador. Assim, a simples imunidade ao controle jurisdicional não é capaz de assegurar solo propício para os negócios. Assim como a revisão judicial constante pode implicar um desestímulo aos negócios, pois os agentes poderiam deixar de confiar nas determinações do regulador, a estipulação a priori de imunidade dos atos regulatórios ao controle jurisdicional e a possibilidade de uso abusivo das prerrogativas da Administração também não geram ambiente favorável ao investimento privado.

91 ROCHA, Jaqueline Mainel. Discricionariedade técnica e poder normativo das agências reguladoras brasileiras. Limites jurídicos da regulação e defesa da concorrência, p. 163.

92 ORTIZ, Gaspar Ariño apud CIRIANO VELA, César David. Administración económica y discrecionalidad (un análisis normativo y jurisprudencial), p. 337, nota 432.

93 CIRIANO VELA, César David. Administración económica y discrecionalidad (un análisis normativo y jurisprudencial), pp. 139-140 e 197.

94 Idem, p. 446.

95 “Não há discricionariedade administrativa junto ao direito administrativo sancionador porque os conceitos utilizados, ou bem para a descrição de infrações como hipóteses de fato, ou bem para a relação de sanções possíveis como finalidade da norma jurídico-administrativa, devem ser, como todos os conceitos jurídicos, simplesmente interpretados.” PIRES, Luis Manuel Fonseca. Controle judicial da discricionariedade administrativa: dos conceitos jurídicos indeterminados às políticas públicas, p. 180.

96 As referências foram tiradas da Lei 12.529/2011, que estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, arts. 36, III, e 38, caput.

97 Sobre a questão, cf. ROMAN, Flavio José. Os regulamentos e as exigências da legalidade: estudo sobre a viabilidade dos regulamentos delegados no ordenamento jurídico brasileiro, pp. 209-212. Sobre o princípio da determinabilidade, cf. PRATES, Marcelo Madureira. Sanção administrativa geral: anatomia e autonomia, pp. 83-85.

98 Cabe, nesse ponto, a referência ao estudo de Schirato sobre resolução da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL). O autor, a propósito, refere-se especificamente à questão da tipificação das condutas mediante recurso a conceitos indeterminados, que conferem discricionariedade à autoridade administrativa: “no que concerne à existência de discricionariedade decorrente do emprego de conceitos jurídicos indeterminados, pode-se mencionar o disposto no art. 5º [da minuta de resolução objeto da Consulta Pública 847/2007], segundo o qual o controlador de pessoa jurídica infratora deverá ser penalizado no caso de ter agido com má-fé (de forma consistente com o art. 177 da Lei 9.472/1997). Má-fé é um conceito jurídico indeterminado e, em vista disso, a agência procurou, no § 1º do art. 5º, dar a necessária significação a tal conceito, a fim de eliminar a discricionariedade. Contudo, ao fazê-lo recorreu, nos incisos III e IV a outros conceitos jurídicos indeterminados (modo temerário, no inciso III, e incidentes infundados, no inciso IV), o que tem como consequência a permanência de discricionariedade decorrente do emprego de conceitos jurídicos indeterminados, ainda que reduzida pelo disposto no inciso I e II do § 1º do art. 5º.” SCHIRATO, Vitor Rhein. Discricionariedade e poder sancionador: uma breve análise da proposta de regulamento da ANATEL. Revista de direito público da economia, ano 6, nº 23, p. 05, da versão eletrônica.

99 GORDILLO, Agustín. Tratado de derecho administrativo, pp. X-16 e X-19.

100 Cf. CORDEIRO, André Felipe de Barros. Teoria dos conceitos jurídicos “indeterminados” aplicada ao direito administrativo, p. 106.

101 Em sentido semelhante, Luciana Sant’ana Nardi já havia observado, quando retrata o pensamento de Eva Desdentado Daroca, que a “característica principal desta apreciação [técnica] é que não reside apenas na preferência do sujeito que a realiza, mas em critérios de natureza científica, o que a qualifica como uma atividade objetiva. Se o método científico não oferece verdades absolutas, também não são opiniões subjetivas.” NARDI, Luciana Sant’ana. Discricionariedade administrativa e “discricionariedade técnica”, pp. 64-65.

102 A proposta formulada está longe de ser unânime na doutrina. Basta ver a lição Carvalho Filho, segundo a qual “[q]uando se trata de competência, da finalidade e da forma, o administrador atua [sempre] vinculadamente”. Por isso, “os aspectos de conveniência e oportunidade da conduta, a valoração recai sobre as razões que devem inspirar o ato (motivo) e sobre o conteúdo que o ato deve conter (objeto).” CARVALHO FILHO, José dos Santos. Discricionariedade técnica e controle judicial. Revista de direito da Administração Pública, v. 1, nº 1, p. 228. Em nossa avaliação, o único elemento que é sempre vinculado, em qualquer hipótese, é a competência subjetiva, porque esse elemento compõe uma das exigências do conteúdo material da legalidade. Cf. ROMAN, Flavio José. Os regulamentos e as exigências da legalidade: estudo sobre a viabilidade dos regulamentos delegados no ordenamento jurídico brasileiro, p. 180, e QUEIRÓ, Afonso Rodrigues. Os limites do poder discricionário das autoridades administrativas. Revista de direito administrativo, v. 97, p. 03, que ensina que “a competência subjetiva é sempre vinculativamente fixada pelo legislador.”

103 Ao propormos a necessidade de avaliação técnica previamente à execução do ato, o conceito se aproxima de algum modo da conceituação formulada por Cretella Júnior. “Atividade que se concretiza pelo emprego das noções e métodos próprios de várias ciências, artes ou disciplinas, em função preparatória ou instrumental, relativamente ao exercício da ação administrativa.” CRETELLA JÚNIOR, José. Discricionariedade técnica [verbete]. Enciclopédia Saraiva do Direito, p. 451.

104 Lei 9.784/1990: “Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando: I – neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses; II – imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções; III – decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública; IV – dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório; V – decidam recursos administrativos; VI – decorram de reexame de ofício; VII – deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais; VIII – importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo.” Lei 4.717/1965: “Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no art. anterior, nos casos de: (…) d) inexistência dos motivos”. Constituição, art. 5º: “LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

105 PERTENCE, José Paulo Sepúlveda; BARROSO, Luís Roberto. Resolução da Anvisa que proíbe o uso nos cigarros de ingredientes que não oferecem risco à saúde. Invalidade formal e material da medida. Incompetência, desvio de finalidade e asfixia regulatória [parecer]. Revista de direito administrativo, v. 269, p. 290.

106 Idem, p. 301.

107 No contexto da discricionariedade das agências reguladoras, já se afirmou que “[n]ão há como impedir que as agências reguladoras, em certos casos, tomem decisões político-ideológicas, baseadas em critérios subjetivos de oportunidade e conveniência, ainda que também fundamentadas com critérios técnicos e científicos. Em outras palavras, as agências podem agir com uma discricionariedade técnica, e isto pode fatalmente ser confundido com posicionamento que, longe de ser técnico, possui fundamento de natureza política.” MASTRODI, Josué; COSTA, Lucas Rocha Mello Emboada da. MASTRODI, Josué; EMBOADA DA COSTA, Lucas Rocha Mello. A discricionariedade técnica e o controle político das agências reguladoras no Brasil. A&C Revista de direito administrativo & constitucional, nº 62, p. 188.

108 Sobre o controle da discricionariedade pelo princípio da proporcionalidade, cf. ROMAN, Flavio José. Discricionariedade técnica na regulação econômica, p. 206 e ss. e ROMAN, Flavio José. O controle da discricionariedade da Administração pelo princípio constitucional da proporcionalidade. Revista de direito constitucional e internacional, ano 17, v. 67, passim, bem como as referências bibliográficas lá referidas.

109 “A dinâmica administrativa de nossos dias não é argumento bastante para a eliminação da reserva da lei no âmbito das prestações económicas e sociais. A tese de que é preferível uma administração operativa embora autónoma a uma administração que não actua, tendo em vista os interesses e necessidades sociais em causa, não é convincente nem sequer do ponto de vista sociológico em que a sua defesa costuma ser colocada. Não está provado que a dispersão das actividades administrativas conduza sempre aos melhores resultados e sobretudo não é possível provar que administração funciona tanto mais eficientemente quanto mais tênue fosse a sua vinculação à lei.” MONCADA, Luis Solano Cabral de. Lei e regulamento, p. 220.

110 “Na verdade, parece oportuno esclarecer que será tarefa quase impossível a fixação de normas genéricas para a aplicação do controle judicial da discricionariedade técnica”. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Discricionariedade técnica e controle judicial. Revista de direito da Administração Pública, nº 1, p. 235.

111 PIRES, Luis Manuel Fonseca. Controle judicial da discricionariedade administrativa: dos conceitos jurídicos indeterminados às políticas públicas, p. 206.

112 Idem, p. 235. No trecho completo o autor afirma o seguinte: “Quanto maior a indeterminação de um conceito jurídico, tanto mais densa deve ser a motivação, tanto mais presente deve ser o controle judicial a aferir se há adequação entre os fatos concretos e a qualificação jurídica invocada. É precisa, portanto, a sentença de síntese da jurista mencionada [Maria Teresa de Melo Ribeiro]: ‘Em suma, o que a Administração ‘ganha’ em relação ao poder legislativo ‘perde’ a favor do poder judicial.’”

113 Celso Antônio Bandeira de Mello ensina que o Direito Administrativo deve ser visto “como um conjunto de limitações aos poderes do Estado ou, muito mais acertadamente, como um conjunto de deveres da Administração em face dos administrados.” BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo, p. 43. Mais recentemente, a questão foi retomada e cuidadosamente reafirmada: “Deveras, o direito administrativo protege o cidadão contra o uso desatado do poder – nesse sentido é escudo – e possibilita ao cidadão atacar o uso desatado do poder – e nesse sentido é arma. Em suma: escudo e arma do cidadão.” MARTINS, Ricardo Marcondes. Regulação administrativa à luz da Constituição Federal, p. 18, nota 9.

114 “O Judiciário, tem, claro, seu papel no controle das falhas e omissões das autoridades legislativas e administrativas, mas ele não é o Legislativo nem a administração e não pode substituí-los em tudo”. SUNDFELD, Carlos Ari. Princípio é preguiça? Direito e interpretação: racionalidade e instituições, p. 296. Em sentido semelhante: “dizer que o juiz não se pode abster de resolver pretensões que se lhe coloque, não há-de significar admitir um controlo que o autorize a gerar regras jurídicas (nem que lhe seja apenas para o caso concreto), só tendo o poder para as interpretar e aplicar. O que significa que o juiz só pode realizar um controlo de direito, não lhe competindo criar regras jurídicas para a satisfação das necessidades sociais, uma vez que isso é da competência exclusiva da Administração.” OLIVEIRA, Fernanda Paula. A discricionariedade de planeamento urbanístico municipal na dogmática geral da discricionariedade administrativa, p. 107.

115 Nesse sentido, a lição de Cabral de Moncada: “Na verdade, a controlabilidade total não eliminaria a discricionariedade (ou liberdade análoga) do agente administrativo; transferia-a simplesmente das mãos deste para as do juiz, com a desvantagem de a colocar assim em sede imprópria, junto de um órgão que não está para ela apetrechado, que conhece mal certas realidades, e que não tem para tanto qualquer vocação funcional e que não é além do mais politicamente responsável pelas decisões ou deliberações que toma quer perante a opinião pública quer perante outros órgãos do poder. Perder-se-ia a prudência, o bom-senso e o sentido de interesse público que, apesar de tudo, a administração sabe gerir.” MONCADA, Luís Solano Cabral de. Lei e regulamento, pp. 861 e 862.

116 OLIVEIRA, Fernanda Paula de. A discricionariedade de planeamento urbanístico municipal na dogmática geral da discricionariedade administrativa, p. 100.

117 “Cuando prescinde de toda norma la sentencia es arbitraria y con ello inconstitucional, también se la considera arbitraria cuando, si bien cita alguna disposición, carece de todo fundamento serio para aplicarla; se la seriedad se estima no ya en la exactitud del criterio del juez, sino en que aporte razones y elementos de juicio para fundar su resolución”. GORDILLO, Agustín. Tratado de derecho administrativo, t. 1, p. VII-41.

118 No sentido proposto, cf. CIRIANO VELA, César David. Administración económica y discrecionalidad (un análisis normativo y jurisprudencial), p. 395. Vale a referência a Andreas J. Krell: “a idéia de um controle judicial funcionalmente limitado também não colide, necessariamente, com a garantia constitucional de inafastabilidade da tutela jurisdicional do art. 5º, inciso XXXV, da Carta Brasileira de 1988.” KRELL, Andreas Joachim. A recepção das teorias alemãs sobre “conceitos jurídicos indeterminados” e o controle da discricionariedade no Brasil. Interesse público, v. 5, nº 23, p. 09.

119 Até mesmo autores críticos da existência de uma discricionariedade técnica reconhecem certos limites ao controle jurisdicional. Calha aqui a referência, vez mais, ao estudo de Eva Desdentado Daroca: “Es cierto que un control pleno de los actos no siempre es posible. (…) En estos supuestos, el que la elección última llevada a cabo por la Administración, siempre que sea conforme al conjunto del ordenamiento jurídico, no pueda ser rebatida jurídicamente y no pueda ser objeto de sustitución por los tribunales, no implica vulneración de los artículos 24, 103 y 106 de la CE, porque no se excluye el control jurídico por los tribunales. Estos realizan su control tan lejos como la Constitución les habilita para ello, utilizando parámetros jurídicos.” DAROCA, Eva Desdentado. Los problemas del control judicial de la discrecionalidad técnica: un estudio crítico de la jurisprudencia, pp. 144-145. Os artigos referidos da Constituição espanhola asseguram, entre outros, o direito dos cidadãos de obter tutela efetiva de juízes e tribunais no exercício de direitos e interesses legítimos (art. 24, 1). Determina, ademais, a submissão da Administração à lei e ao Direito (art. 103, 1). Enfim, estabelecem a competência dos tribunais para o controle da legalidade da atuação administrativa (art. 106, 1).

120 Deferência é atitude de respeito e consideração. É expressão sinônima de cortesia, obséquio, e antônima de desprezo e desdém. Cf. HOUAISS, Antônio e VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, p. 925, 2ª e 3ª col., verbete “deferência”.

121 Superior Tribunal de Justiça, Segunda Turma, REsp 1.171.688/DF, rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 01.06.2010, DJe 23.06.2010.

122 O novo Código de Processo Civil brasileiro, Lei 13.105/2015, art. 489, § 1º, inciso II, estabelece o seguinte: “Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: (…) empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso”. O dispositivo instituiu um dever de motivação do magistrado no controle dos conceitos indeterminados a exigir uma explicitação clara do sentido empregado e, por consequência, das razões pelas quais considere, eventualmente, equivocado o sentido empregado pela Administração. Tudo em ordem a reforçar a deferência com o juízo realizado pela Administração.

123 “[É] certo, porém, que tanto o ‘erro manifesto’ quanto o ‘erro não manifesto’ são ilegais e devem ser controlados e corrigidos, jurisdicionalmente; a tolerância do erro, manifesto ou não manifesto, se não concedida pela lei, não pode ser concedida pelo juiz; ademais não se pode responder de modo satisfatório onde começa e onde acaba o caráter manifesto do erro.” GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto, p. 215. “[N]ão se deve reclamar apenas o erro dito manifesto. Ao se requerer a presença deste, estar-se-á diante de algo bastante indefinido, permitindo que [ora] se faça um controle mais vasto, ora nenhum controle, pois, ao final, caberá ao juiz lhe fixar os limites, o que faz com que a verificação da legalidade passe para um terreno de forte subjetivismo. De mais a mais, em assim entendendo, resultará na admissão do erro não manifesto, o qual é igualmente ilegal tanto quanto o erro dito manifesto. (…) a revisão judicial haverá de se direcionar à demonstração do equívoco – não necessariamente manifesto – na verificação da existência e da correspondência do motivo (pressuposto fático da decisão administrativa)”. NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. Há uma discricionariedade técnica? Revista do programa de pós-graduação em direito da Universidade Federal da Bahia, nº 28, pp. 131 e 135. Em sentido oposto: “Quanto às decisões discricionárias envolvendo conteúdo técnico, tomados pelo órgão ou entidade especializado, gozam elas de uma presunção reforçada de legitimidade, cabendo ao Judiciário revê-las apenas diante de erro grosseiro. Não fosse assim, estar-se-ia autorizando que a opinião do perito judicial substituísse a deliberação dos peritos da Administração, em clara violação da separação de poderes.” BARROSO, Luís Roberto. Sistema financeiro nacional. Alienação de instituição submetida a RAET. Discricionariedade técnica do Banco Central. Limites legítimos do controle jurisdicional [parecer]. Revista Forense, v. 375, p. 271.

124 No direito público não faria muito sentido falar em vício de vontade quando já se assentou na melhor doutrina a irrelevância da vontade na teoria do ato administrativo. No direito público, fala-se em atendimento à finalidade legal: “perante propriedade está-se no reino da autonomia da vontade, perante administração, contrariamente, está-se no reino da finalidade, proposta como impositiva, como obrigatória (…), pois o bem (sagrado na ordem jurídica) é a finalidade estampada na lei.” BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Desvio de poder. Revista de direito público, p. 26. Assim, na ciência do direito administrativo, é pouco considerado o móvel ou a vontade subjetiva do agente. Cf. ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. A irrelevância da vontade do agente na teoria do ato administrativo, p 54

125 Cf. HOUAISS, Antônio e VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, p. 1837, 2ª col., verbete “manifesto”, especialmente as acepções 5 a 7, adjetivo.

126 DE PLÁCIO E SILVA. Vocabulário Jurídico, p. 340, verbete “erro grosseiro”. No trecho, o autor também afiança o erro grosseiro como aquele que externa má-fé e, por isso, indesculpável, tudo em razão de sua fácil constatação. Em sentido semelhante: “É o engano facilmente constatável, visível de tal modo que o agente resta impossibilitado de justificar-se ou se desculpar quanto à verdade por ele falseada.” FRANÇA, Rubens Limongi. Enciclopédia Saraiva do direito, verbete “erro grosseiro” da Comissão de Redação, p. 522.

127 “O remédio para isto [o espaço de livre apreciação pericial] não pode ser procurado na atribuição à autoridade administrativa competente do poder de, livremente, interpretar conceitos legais técnicos. Decisivo é se, na a organização e processo da entidade administrativa pericial, existe suficiente segurança de que o caso técnico foi abordado de forma geral e imparcial.” BULLINGER, Martin. A discricionariedade da Administração Pública, p. 19.

128 Ao apreciar concretamente um ato de intervenção do Banco Central do Brasil no mercado financeiro, Luís Roberto Barroso destaca a necessidade de ponderar as circunstâncias em que editado o ato submetido a controle jurisdicional e a impossibilidade de se valer de conhecimentos que não são contemporâneos à edição do ato discricionário: “as decisões discricionárias tomadas pelo Banco Central somente podem ser valoradas na conjuntura em que levadas a efeito, à vista das ameaças, riscos, pré-disposições e crises globais então vigentes. Não é possível, quase uma década depois, comentar o vídeo-tape, rever os lances em câmera lenta, beneficiar-se do conhecimento de toda a história superveniente e propugnar soluções alternativas.” BARROSO, Luís Roberto. Sistema financeiro nacional. Alienação de instituição submetida a RAET. Discricionariedade técnica do Banco Central. Limites legítimos do controle jurisdicional. Revista Forense, v. 375, p. 275.

129 Para conhecer a referida crítica, cf. FIGUEIREDO, Marcelo. Agências reguladoras, p. 96.

130 A constitucionalização do direito administrativo e a crescente na judicialização da Administração “são de tal ordem que se pode afirmar que o Judiciário vem, indiretamente, interferindo com políticas públicas adotadas pelos Governos federal, estaduais e municipais.” DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Da constitucionalização do direito administrativo: reflexos sobre o princípio da legalidade e a discricionariedade administrativa. Supremacia do interesse público e outros temas relevantes do direito administrativo, p. 189.

131 SUNDFELD, Carlos Ari. Princípio é preguiça? Direito e interpretação: racionalidade e instituições, pp. 300-301e 304. Após enunciar os ônus regulatórios a serem cumpridos pelo juiz no controle de atos regulatórios, lembramos certa oportunidade em que nos consultaram sobre a possibilidade de se firmar termos aditivos qualitativos superiores ao limite de 25% nos contratos administrativos. Após detalharmos as exigências previstas na jurisprudência do Tribunal de Contas da União (cf. Decisão 215/99, Plenário, rel. Min. José Antonio B. de Macedo, julgado em 12.05.1999, DOU 21.05.1999), que vão da exigência de comprovação da existência de fato superveniente, passam pela não transfiguração do contrato originário até a comprovação de que essa medida é economicamente superior à rescisão contratual, entre outras, o consulente afirmou desolado: “Entendi, não é para fazer…” Não se quer com isso afirmar que o controle não deve incidir, mas que deve fazê-lo com deferência, respeito à segurança jurídica e atento ao princípio da separação de poderes.

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